O agricultor familiar tem nas mãos ferramentas que permitem reduzir o desperdício de alimentos, o que diminui o custo de produção, aumenta a renda e contribui para elevar também o abastecimento. O uso de embalagens adequadas para o transporte, como a substituição de caixas de madeira por plásticas, o processamento ou doação dos produtos mais "feios" e a criação de circuitos curtos de comercialização são algumas propostas de executivos de entidades ligadas ao campo.

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, na sigla em inglês) estima que 30% das frutas e hortaliças produzidas no mundo são jogadas fora no pós-colheita, o que equivale a mais de 1,3 bilhão de toneladas ao ano. Desperdício que é ainda mais difícil de digerir quando se considera que uma a cada nove pessoas passa fome em todo o globo, de acordo com a mesma entidade.

Para debater e dividir estratégias para conter o desperdício e melhorar a renda dos agricultores, a FAO organizou entre os dias 17 e 19 deste mês, na Costa Rica, a 5ª Reunião da Rede Regional de Sistemas Públicos de Abastecimento e Comercialização de Alimentos. O superintendente de Abastecimento Social da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Newton Araújo Júnior, apresentou as iniciativas brasileiras no combate à perda de alimentos no evento, que contou com representantes de 12 países da América Latina.

Legislação
Araújo Júnior afirma que deu maior destaque ao debate sobre a criação de legislações que permitem a doação e a criação de circuitos de doações de alimentos. A Conab promove hoje essa medida no País, com a compra da produção excedente por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), ligada ao Ministério da Casa Civil. "Temos possibilidade de usar recursos para agregar valor a produtos em bancos de alimentos, que distribuem para cozinhas comunitárias ou restaurantes populares. Contra perdas, precisamos de ações estruturantes, com a modernização das centrais e com um sistema de informações para o produtor e o consumidor", diz.

Uma das estratégias apresentadas pela Conab no encontro foi a correta higienização, embalagem e transporte em caixas plásticas, no lugar das mais comuns, de madeira. Há um programa nacional de substituição nas próprias centrais de abastecimento, como a de Minas Gerais e a de Campinas. As embalagens são entregues em um banco, para limpeza, e o produtor recebe vales para a retirada de caixas já higienizadas.

O executivo da Conab afirma que a ação reduz perdas com o manuseio inadequado e o dano mecânico. "Essa prática aumenta a vida útil dos hortifrutis e garante mais qualidade sem a contaminação de pragas, umidade, fungos e bactérias que se alojam na madeira", cita.

Os costa-riquenhos têm iniciativa semelhante, na qual investem alto, diz Araújo Júnior. "Eles limpam, embalam, estocam com refrigeração e há toda uma logística para os centros de distribuição", conta.

O Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) também orienta para a substituição de caixas de madeira por plásticas, por meio do Programa de Classificação, Embalagem e Rotulagem das Centrais de Abastecimento do Paraná (Ceasa-PR). O coordenador estadual de olericultura do Emater, Iniberto Hamerschmidt, afirma que não é proibido, porém, o uso de caixas de madeira. "É uma tendência, mas a caixa de plástico precisa ser retornável, para o custo não ficar alto, e higienizada antes do uso."

A consequência imediata é a redução das perdas. "O menor desperdício diminui o custo de produção, eleva a oferta e cai o preço ao consumidor. É um processo em que todas as partes ganham", completa o superintendente de Abastecimento Social da Conab.

Modelos de aproveitamento
A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) também tem na manga outras iniciativas que precisam ser estendidas pelo País, para melhorar o aproveitamento de alimentos. Um exemplo executado em Minas Gerais é o barracão do Produtor, que serve como central para pequenos agricultores para o melhor acondicionamento de produtos e agregação de valor. Outra iniciativa é o projeto Sopa Amiga, de Recife, que aproveita os excedentes não comercializados nas Centrais de Abastecimento (Ceasa) para alimentar 10 mil pessoas mensalmente.
O superintendente de Abastecimento Social da Conab, Newton Araújo Júnior, defende os circuitos curtos de transporte e comercialização. "A perda começa quando se colhe o alimento, que vai perdendo água no transporte conforme o tempo passa. Se está limpo, embalado, e estocado de forma refrigerada, isso diminui", conta.
O coordenador estadual de olericultura do Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), Iniberto Hamerschmidt, lembra ainda que é possível processar alimentos "mais feios" para agregar valor. "Se o tomate tem manchas, pode ser aproveitado em molhos, e se a cenoura saiu pequena demais, pode virar conserva", diz.
Hamerschmidt ainda cita o aproveitamento de folhas, como a da beterraba, para a produção de farofas. Tudo para também elevar o consumo de alimentos saudáveis entre a população. "O consumo de hortaliças no Brasil é de 45 quilos por habitante ao ano e deveria ser de 145 quilos, que é o que a Organização Mundial de Saúde determina." (F.G.)