Avaliação é de que setores como a indústria automobilística ainda vão levar tempo para sentir o efeito da queda da Selic
Avaliação é de que setores como a indústria automobilística ainda vão levar tempo para sentir o efeito da queda da Selic | Foto: Arquivo Folha



Há muito tempo a economia brasileira não gerava tantas notícias positivas. A inflação oficial de janeiro, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), foi de apenas 0,38% - a menor para o mês de toda a série histórica. Em reunião na semana passada, o Conselho de Política Monetária (Copom) reduziu a taxa básica de juros de 13% para 12,25% ao ano. A Selic agora está no mesmo patamar de dois anos atrás. O Índice de Confiança do Consumidor (ICC), da Fundação Getúlio Vargas, subiu 2,5 pontos em fevereiro, alcançando 81,8 pontos, o maior nível desde dezembro de 2014.

Na contramão, o IBGE divulgou na última sexta-feira (24) um novo recorde de desemprego. No trimestre encerrado em janeiro, eram 12,921 milhões de brasileiros sem ocupação, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), cuja série histórica teve início no primeiro trimestre de 2012. No mês passado, o País contava com 3,302 milhões de desempregados a mais que em janeiro de 2016 - aumento de 34,3%.

Segundo os economistas, os índices de emprego são os últimos a serem atingidos durante as crises. Mas, também os últimos a se recuperarem. As apostas são de que as empresas continuarão a demitir durante o primeiro semestre deste ano. Há uma espécie de roteiro a ser seguido até que o setor produtivo comece a gerar novos postos de trabalho, conforme explica o economista, professor da Universidade Federal Tecnológica do Paraná (UTFPR) e consultor da Associação Comercial e Industrial de Londrina (Acil), Marcos Rambalducci. "Primeiro, os juros caem. Na sequência, os empresários se animam a tomar crédito, comprar equipamentos e investir. Só depois, passam a contratar", ressalta.

PIB
Há também, de acordo com ele, um momento em que as empresas "expurgam a ociosidade" de mão de obra que possa existir. Rambalducci acredita que o Produto Interno Brasileiro (PIB) vai parar de cair em março ou abril. "Lá para julho ou agosto o desemprego deve começar a diminuir."

O economista da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Roberto Zurcher, lembra que, no início da crise, as empresas tiveram queda de produção, mas "mantiveram nível elevado de emprego", prevendo uma recuperação. Como a recuperação não veio, o desemprego cresceu. "Com o atual nível de demanda (por bens e serviços), o desemprego vai continuar aumentando. Pode haver uma desaceleração das demissões", avalia. Mas a próxima Pnad Contínua, referente ao período de fevereiro a abril, ainda vai mostrar um aumento do cortes de vagas, segundo Zurcher.

Para ele, alguns setores específicos podem começar a contratar a partir de abril, época em que normalmente a economia ganha dinamismo. Mas não é o caso da indústria de produtos de alto valor agregado como a automobilística e da linha branca. "Até a redução da Selic passar a surtir efeito são necessários vários meses", sustenta.

Economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômico (Dieese), Fabiano Camargo da Silva afirma que o desemprego vem aumentando em ritmo menor que antes. "As empresas fizeram seus ajustes e logo não terão mais como demitir", acredita. Ele diz que o número de desocupados vai se estabilizar em breve. Mas acha difícil haver recuperação de vagas perdidas, se o governo mantiver a atual política macroeconômica. "As práticas de austeridades implantadas por esse governo, com os cortes de investimentos, põem nossa economia numa situação pior", avalia.

Silva compara o modelo econômico do governo Michel Temer (PMDB) com o de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), nos anos 1990. "O Brasil não cresceu com essa política."
Ele ressalta que Temer aposta nas reformas trabalhista e da Previdência e que, se elas forem aprovadas no Congresso, pode haver criação de novos empregos. "Mas serão postos de trabalho precarizados." Outra preocupação do economista é que as empresas capitalizadas aproveitaram a fase de ociosidade produtiva para se automatizarem. E, com isso, vão requerer menos mão de obra quando o ritmo de produção aumentar.

Dívida herdada
Já Marcos Rambalducci, da UTFPR, acredita que a política econômica segue o caminho correto. Na opinião dele, pelo fato de ter assumido o mandato com uma dívida herdada da antecessora Dilma Rousseff, Michel Temer não teve opção a não ser cortar gastos. Ainda sob gestão petista, de acordo com ele, o governo precisou buscar recursos no mercado para se financiar. Para isso, elevou os juros. "Com a Selic alta, o empresário prefere deixar de investir na produção para adquirir títulos do governo."

E todo o dinheiro arrecadado, destaca Rambalducci, vai para custear "a pesada máquina" do Estado brasileiro. "Não sobra para investimentos." Por isso, na opinião dele, Temer precisou parar de gastar para controlar a dívida e, assim, poder baixar os juros. "Com a queda de juros, quem tem dinheiro agora começa a ver que não vale a pena comprar título do governo. E começa a pensar em investir novamente", explica.

Investimento
O presidente do Sindicato dos Economistas, Ronaldo Antunes, diz que o desemprego só vai diminuir quando o governo voltar a investir. "Terá de retomar projetos como o Minha Casa Minha Vida. Terá de fazer parcerias público-privadas e investir em infraestrutura. Só investimento gera trabalho", afirma. Ele não acredita que isso possa ocorrer ainda no primeiro semestre e alega que o desemprego vai se estabilizar num nível "insustentável".

Para Antunes, o Banco Central "se mostrou lento" na redução dos juros. "Por mais que tenha baixado, a taxa real ainda é muito alta. Quando subtraímos a inflação da Selic, temos uma taxa real de, mais ou menos, 7,25%. É maior que quando a Selic estava em 14% e a inflação a 10%", alega. (N.B.)