Quando considerados somente os setores de infraestrutura e energia, o Brasil passa ao segundo lugar do ranking de investimentos chineses
Quando considerados somente os setores de infraestrutura e energia, o Brasil passa ao segundo lugar do ranking de investimentos chineses | Foto: Caio Coronel/Itaipu Binacional



A compra da empresa londrinense Belagrícola pelo grupo DKBA, revelada nesta terça-feira pela FOLHA, é uma pequena parte daquilo que os chineses estão dispostos a investir no Brasil. Não há crise econômica e política que amedronte os asiáticos. Até 9 de março deste ano, eles já aportaram US$ 4,8 bilhões no País, praticamente o mesmo valor de todo o ano de 2015. Há quem aposte que a China colocará US$ 20 bilhões no Brasil em 2017, o que seria um recorde histórico. Nesta terça-feira, foi lançado em São Paulo o Fundo Brasil-China, que terá um aporte de US$ 20 bilhões destinado a financiar projetos considerados prioritários entre os dois países.

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Números levantados pela consultoria AT Kearney mostra que o País vive uma nova onda de "invasão" chinesa desde 2015, depois de quatro anos de retração dos investimentos daquele país (ver quadro). A pesquisa mostra que no período de janeiro de 2014 a 9 de março deste ano o Brasil foi o quarto país do mundo que mais recebeu capital da China. Foram US$ 21,9 bilhões, 97% deles investidos em energia e infraestrutura. O primeiro da lista foram os Estados Unidos, onde investiram US$ 98,3 bilhões, no período. Depois veio a Suíça, com US$ 53,2 bilhões, e Hong Kong, com US$ 41,4 bilhões.

Quando considerados somente os setores de infraestrutura e energia, o Brasil passa ao segundo lugar do ranking. Os chineses investiram US$ 28,2 bilhões nos Estados Unidos, nessas duas áreas desde 2014, e US$ 21,3 bilhões no Brasil.
Sócio da empresa de fusões e aquisições JMB, o empresário londrinense Fernando Kireeff explica por que os chineses estão vindo com tudo para cima do Brasil.

Imagem ilustrativa da imagem Brasil vive nova 'invasão' chinesa



"Eles têm uma grande vantagem que é custo de capital muito baixo. É fácil para as empresas chinesas levantarem dinheiro lá e saírem comprando pelo mundo. Por outro lado, o Brasil está muito barato, com a desvalorização do real", analisa.

Mas não é só isso. Há uma questão estratégica chinesa ligada à segurança alimentar. "Existe uma preocupação de assegurar parte da produção de alimentos para eles." Por isso, devem vir com bastante apetite para comprar outras empresas como a Belagrícola, cujo principal negócio é a comercialização de grãos e insumos.

Fragilidade
Segundo Kireeff, a escassez de crédito no Brasil, causada pela crise econômica, coloca esses empreendimentos em situação de fragilidade. Um exemplo disso é a Seara, com sede em Sertanópolis (Região Metropolitana de Londrina), que no mês passado entrou com processo de recuperação judicial. Um dos motivos alegados foi justamente a redução de crédito no mercado. "São modelos de negócio muito baseados em crédito", afirma. A tendência do setor, segundo Kireeff, é de concentração. E os chineses devem participar desse processo.

O empresário acredita também que os chineses estão ocupando espaços deixados, por exemplo, pelas grandes empreiteiras nacionais envolvidas na Lava Jato. Ele lembra ainda que os espanhóis tinham participação importante na área de infraestrutura brasileira e que essa participação diminuiu com a crise econômica na Europa. "Os chineses também se aproveitam disso."

Menos protecionismo é incentivo, diz advogado
O advogado paulistano Mário Nogueira, do escritório Demarest, atende clientes chineses interessados em fazer negócios no Brasil. Segundo ele, a nova onda de investimentos do país asiático é de empresas menores comparadas com as gigantes que já se instalaram antes. "São do setor agrícola, indústrias farmacêuticas, de eletrônicos, de automóveis."
De acordo com Nogueira, um fato que vem animando bastante os chineses é a redução dos índices de conteúdo nacional exigidos pela Petrobras para contratar outras empresas. Eles foram diminuídos no começo do ano. "Com os índices anteriores, as empresas da China não conseguiam competir."

Questionado por que os chineses não se assustam com a crise política e econômica brasileira, ele responde: "Assustar elas assustam. Mas, dependem e vão depender eternamente das commodities brasileiras. Isso faz com que invistam no Brasil. Além disso, os chineses não estão preocupados com o mercado interno brasileiro, já que vão levar toda a produção. Por isso, a economia daqui não os preocupa tanto."

O advogado londrinense Bruno Pedalino também vem conversando com chineses na tentativa de trazer investimentos para a região. Ela garante que está negociando a vinda de uma indústria, cujo investimento seria entre R$ 150 milhões e R$ 200 milhões. Tudo que revela é que a empresa não pertence ao setor do agronegócio. "Está na África do Sul e Europa e agora quer se instalar no Brasil."

Na opinião de Pedalino, os chineses se assanharam mais para investir no Brasil após o fim do governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), considerada muito protecionista por ele. "Depois da posse do Temer (presidente Michel Temer – PMDB), as portas do País se abriram para a China", declara. (N.B.)

BNDES será operador do fundo Brasil-China
Rio - O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) será um dos operadores do Fundo de Cooperação Brasil-China, lançado nesta terça-feira, 30, pela Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento e pelo Fundo de Cooperação Chinês para Investimento na América Latina (Claifund).
Segundo o BNDES, o Fundo China terá até US$ 20 bilhões, destinados principalmente a financiar investimentos em infraestrutura. Depois de dois anos de negociação, esse fundo começa a operar já nesta quinta-feira, dia 1º. O instrumento foi anunciado em 2015, durante visita do presidente da China, Xi Jinping, ao Brasil.
"Os setores estabelecidos como prioritários para receber financiamento do fundo são principalmente os ligados à infraestrutura, como os de logística e energia, mas serão avaliados também projetos em outros setores, como indústria, recursos minerais, agroindústria, novas tecnologias e serviços digitais", diz a nota do BNDES.
Ainda conforme o banco de fomento, do montante total, US$ 15 bilhões serão desembolsados pelo Claifund e outros US$ 5 bilhões pelas instituições brasileiras que participarão do financiamento dos projetos. O BNDES e a Caixa Econômica Federal serão os operadores preferenciais do fundo de cooperação, "embora a participação como potencial financiador seja aberta a outras instituições financeiras brasileiras".
Os pedidos de empréstimo serão avaliados pelo Grupo Técnico de Trabalho, formado por representantes do Brasil e do Claifund, e pelo Comitê Diretivo. O comitê será composto por seis membros, três representantes brasileiros e três chineses. "A partir da análise do Grupo Técnico, o Comitê avaliará se os projetos atendem aos interesses do Brasil e da China e oferecerão um certificado aos projetos aprovados", diz a nota do BNDES.
Ainda segundo o banco de fomento, o Claifund participará de cada financiamento na proporção três para um, ou seja, para cada US$ 1 financiado pelas instituições brasileiras, o Claifund contribuirá com outros US$ 3. (Vinicius Neder/Agência Estado)