O apelo do martírio
É clássica na política brasileira a incidência de certos tiques, dentre eles o do vitimalismo e o do homem providencial. Tudo isso, como se viu ontem em Curitiba na segunda audiência do ex-presidente Lula ao juiz Sérgio Moro, persiste de forma indelével: a chegada de Lula no entorno da Justiça Federal, sua imersão na massa e, posteriormente, a oratória de uma pessoa que vive por uma causa um martírio expresso nos processos que enfrenta.

Sua recepção foi bem mais expressiva do que a obtida nas marchas pelo Nordeste em função da meia centena de ônibus que trouxeram à capital paranaense delegações de vários pontos do País, muitas daqui do Paraná mesmo, onde o prestígio do PT não é relevante, a despeito dos seus pouco mais de oitenta mil militantes.

Obviamente, se qualquer um dos inúmeros processos (já há nove com outros no disparo) emplacar a candidatura presidencial poderá estar inviabilizada. Basta que o recurso de sua defesa ao Tribunal Regional da 4ª Região não cole e que aquela instância confirme a sentença do primeiro grau e toda essa marcha e contramarcha estará inutilizada.

Enquanto, porém, isso não ocorrer a motivação da massa será mantida quase no mesmo sentido da original quando ele levou a primeira e acumulou energia para vencer a segunda. Para neutralizar novas denúncias e surpresas como a experimental de Palocci, que tende a agigantar-se na hipótese de uma delação que vem tentando, a linha de argumento é a da coação prisional e o sinal redentor da pena menor e por isso é incompleta, não valeria.

A tática foi definida antes da audiência: se o tom do juiz for político, a resposta será no mesmo diapasão, como aliás também se deu na primeira, inclusive com reiteradas tentativas da defesa de tirar o equilíbrio do magistrado já tido antecipadamente como perseguidor. Tentativas de apontar o ciclo lulista como o que teria mais avançado em igualdade foram desmistificadas por uma das organizações internacionais da esquerda, porém, a aura do herói, que lembra em muitos aspectos a de Getúlio Vargas, assegura a identificação carismática e persistente.

Já uma condenação terá impacto como se deu com Abimael Gusman, líder do Sendero Luminoso, levado à cadeia pela polícia peruana e de um governo de direita.

Quadrilhão
Havia a impressão de que o Ministério da Justiça estaria contendo a Polícia Federal em vista da alteração próxima do seu comando, daí a surpresa provocada pelo seu recente relatório que aponta o presidente Michel Temer com poder decisório no quadrilhão do PMDB e que teria recebido R$ 31,5 milhões. É possível que sirva de base para nova denúncia de Rodrigo Janot. Alvos dessa investigação, além de Temer, Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria Geral ) e os ex-deputados Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima e Henrique Alves, esses todos presos. Essa, porém, não foi a maior derrota do governo e sim a autorização do inquérito para investigar Temer e Rocha Loures pelo ministro Luiz Roberto Barroso, do STF, num caso de tráfico de influência beneficiando empresa (Rodrimar) que atua no porto de Santos e pela qual o presidente teria recebido R$ 1,28 milhão em propinas.

Minimizaram
Na primeira audiência havia expectativa alarmista de chegada de mais de 70 mil pessoas a Curitiba, e agora tudo se deu ao contrário com os cálculos mais conservadores do secretário de Segurança que determinaram redução drástica do contingente policial mobilizado. Polícia Rodoviária Federal anotou 52 ônibus que trouxeram militantes e, dessa feita, ao contrário da primeira, deixou de vistoriar os veículos para apurar se usavam equipamentos ofensivos.

Procuradores
Decisão do prefeito Marcelo Belinati, de Londrina, que determina aos procuradores que batam ponto, além de fustigada pela Ordem dos Advogados, criou uma situação de mal-estar, ainda que celebrada por outros segmentos do funcionalismo municipal. A decisão foi tomada depois de muitas ponderações em reuniões internas. Procuradores acham que podem reverter a medida por se tratar de entendimento nacional, devidamente sumulado, do Conselho de Advocacia Púbica da OAB. Em Curitiba, procuradores - municipais, estaduais, federais - estão livres dessa imposição. São versões diferenciadas sobre isonomia, uns são menos iguais que os outros.

Folclore
Ratinho Júnior afirmou ontem que CPI da Quadro Negro é bravata. Ocorre que o ministro Luiz Fux a ratificou o que gerará problemas políticos até maiores do que discussões nervosas no Legislativo. Setores do governo estão altamente comprometidos e como sempre figuras da intimidade do governador, como se dá também na Publicano. Dizer que não é mais amigo dos indiciados não o salva das presunções maliciosas e normalíssimas em política. Da mesma forma que a fidelidade ao Ezequias, ainda que meritória na perspectiva do agrupamento, não o favorece. De outro lado, vai pegar pela frente a APP que explorará o massacre e agora também a Quadro Negro. Contra Alvaro Dias, os professores se postavam de costas para o palanque e ajudaram a derrotá-lo. Agora, além da violência, o tempero da corrupção, pimenta pura.