Obstáculos inesperados
Embora a relevância que o Ministério Público e o Judiciário atribuem ao substitutivo de Requião de abuso de autoridade percebe-se que outros obstáculos, até aqui não considerados, podem ter efeitos mais desastrosos para a Lava Jato. Um deles poderia, aliás, ter ocorrido ontem no exame de habeas corpus em favor de Zé Dirceu e que poderia, na hipótese da concessão, criar uma linha jurisprudencial relativamente ao alongamento das prisões em Curitiba, a que já se referiu, profeticamente, o ministro Gilmar Mendes, antecipando juízo de valor. Ora, todos os advogados que atuam na causa têm colocado que tal constrangimento seria um fundamento, de viés autoritário, que levaria os depoentes, pelo isolamento, à delação. É verdade que o acervo testemunhal já existente, acompanhado de provas e planilhas, é estarrecedor pela extensão da metástase da corrupção e não há como anulá-lo ou engendrar qualquer processo de reversão.
No corpo a corpo entre poderes, porém, a tentativa, se bem-sucedida, gerará algo tão ou mais grave do que a responsabilização por abuso de autoridade. Aliás, o Ministério Público estadual já deixou claro que se emplacar na Comissão de Constituição e Justiça do Senado o parecer do senador paranaense operações como as da Publicano e da Quadro Negro correm riscos sérios aos exporem procuradores e policiais a sanções inimaginadas.
Até aqui, tanto o STF como o STJ, da mesma forma que o Tribunal Regional da 4ª Região, deram cobertura à linha segura e consistente do juiz Sérgio Moro, mas isso não significa que será sempre assim porque o próprio Teori Zavaski, como relator, fez restrições a atos da instância inferior e se referiu criticamente aos transbordamentos do procurador Deltan Dalagnol quando montou o diagrama que apontava Lula como chefe da quadrilha e que agora ilustra um livro que está para ser lançado.
O fluxo da Lava Jato permitiu que o Brasil visse as dimensões ciclópicas não apenas desse contubérnio Estado-empresas, em que não há linde entre público e privado, negando o sentido essencial da República, e seria doloroso para a consciência nacional, a essa altura, qualquer tipo de recuo que viesse a nutrir a impunidade como sempre.
Suspense
Tudo o que diz respeito ao quadro nacional é regido por um tipo de suspense daqueles que consagraram Alfred Hitchcok: a concessão da liberdade a José Carlos Bumlai pelo STF, é claro que considerando também as suas condições precárias de saúde, gerou expectativa de que tal se repetisse com Zé Dirceu no habeas corpus ontem levado à exame da Corte, mas também em Curitiba se aguardava uma decisão sobre o impasse entre adiar ou não a audiência de Lula marcada para o dia 3 e que tanto a Polícia Federal como a paranaense querem transferir para o dia 10 para apurar questões logísticas e de segurança. Isso diante das manifestações que aqui se darão a favor e contra o presidente Lula e a Lava Jato.

Reação
A polícia brasileira, e aí também a paranaense, procurou agir no caso do assalto a sede da Prosegur (sempre uma transportadora de valores como alvo) em Ciudad del Este no Paraguai e chegou a abater três suspeitos em confrontos e prender dez. O modus operandi é semelhante aos diversos ataques em vários pontos a esse tipo de comércio, sempre com muita violência e uso de técnicas diversionistas como queima de veículos e explosões para desnortear a ação da polícia. Há suspeitas fundadas de que a facção paulista, que atua na guerrilha dos presídios, do PCC esteja no comando desse roubo de R$ 120 milhões, considerado o maior até hoje havido no Paraguai. A gangue se valeu de uma casa de cômodos, uma pensão, em Ciudad del Este, que funcionou como o quartel general da audaciosa operação.

Sobrou para Bruno
Por três votos a um, o goleiro Bruno, que havia sido solto pelo ministro Marco Aurélio em decisão monocrática, voltou para a prisão. Não apenas o agropecuarista Bumlai foi amparado por habeas corpus ontem (três votos a dois) no STF, como também Fernando Moura que havia sido solto e preso novamente por questões de interpretação ligadas a delações premiadas. Caso de Zé Dirceu, o mais relevante, foi transferido porque o Ministério Público queria analisar o pleito do seu advogado que desejava falar na sessão.

Folclore
Na Unidade de Pronto Atendimento da Boa Vista houve incidente entre um paciente e uma funcionária. Aliás, a designação de UPA fica no campo do desejável não do possível porque pronto atendimento, no rigor da expressão, é uma contradição em termos como pronto-socorro, que, por mais urgente que seja o caso, não indica que o paciente será atendido. Ficaria melhor do que UPA um UBA: Unidade de Breve Atendimento. No passado distante, havia o Samdu (Sistema de Assistência Domiciliar Urgente), como temos agora o Samu e a Ecosalva. Afinal, o paciente está condenado a ser justamente isso: paciente!