Versões convenientes
Persiste aquela deficiência radical nos governos: a ausência de filósofos, talvez até mais metafísica do que metas físicas, que aliás são raras. A carência fatal, a ausência de asas no homem como anjo, é não haver espaço para epistemes, reflexão sobre valores, evitar a sobreposição do ter sobre o ser.
O fato é que Beto Richa se encontrou com a presidente Dilma Rousseff e é quase certo que teremos visões diferenciadas do mesmo encontro: o paranaense sugerindo que ganhou a batalha dos empréstimos, conforme a claque já vinha apregoando, e a candidata à reeleição repetindo que no seu dicionário não há espaço para a discriminação, já que governa para todos, atleticanos e coxas, normandos e saxões, guelfos e guibelinos.
O teatro foi armado para que todos os personagens faturassem o evento, inclusive os ministros paranaenses provocados por nossos deputados, figuras mais para a representação mambembe, tal a submissão que eles enxergam como missão em tantos episódios, inclusive aqueles da aproximação com o Judiciário para desfrute dos depósitos judiciais em meio à articulação da escolha do último conselheiro do Tribunal de Contas, fato em exame no STJ e no CNJ.
Diante dessa distância entre fato e versão, corrente na política, essência de sua natureza,
há espaço para uma reflexão sobre biografias a autorizar e supostas verdades a revelar. Quem no mundo não funde o fato com a versão ao contar a própria história? Dá para lembrar do poema de Fernando Pessoa em que fala dos que bloqueiam e mantém oculta a notória pusilanimidade.

Olha o caixa
No feriadão teremos mais uma prova de quanto ansioso anda o governo por dinheiro: forças tarefas irão fiscalizar nas estradas os que não pagaram o IPVA e que alcançam um quarto da frota, atrasos de mais de três anos, numa fatura que alcança R$ 700 milhões. Há um filé minhon na Dívida Ativa com um total equivalente à metade do orçamento de 2014, às vezes mais ao alcance do governo do que as benesses federais. Anuncia-se mais prensa no processo de substituição tributária que imporá prejuízos bem maiores do que o suposto feriado da Consciência Negra no fato de compradores da terra preferirem buscar mercadorias em São Paulo (bebidas, por exemplo) do que as adquirirem aqui.

Justíssimo
Fora do formalismo uma decisão do Tribunal Regional do Trabalho obriga um patrão de bingo clandestino a pagar o empregado. Já há jurisprudência que beneficia cambista do jogo do bicho do bicheiro que o demitiu. Num momento em que prostitutas mineiras generalizam o cartão de crédito urge inovar.

Negritude
Associação Comercial virou caixão de pancada pelos manifestantes a favor do feriado da Consciência Negra e foi alvo dos maiores impropérios. Sobrou, ainda, para o Judiciário que deu a liminar que se pretende contestar. No ritmo das decisões judiciais a solução não virá em tempo da celebração.

Folclore
José Serra teria dito que entre ele e Aécio Neves há diferenças essenciais como entre uma banana e uma laranja. Ora os dois termos são ofensivos numa semântica política, já que banana é o molenga e laranja o usado por outros.
E normalmente muitos são apanhados na caricatura das definições. Diante de um abacaxi, uma contradição ou uma situação-limite, o laranja vira banana e vice versa. Político que vira laranja na beira da estrada, como leciona Ataulfo Alves, ou está bichada ou tem marimbondo no pé.

Aumentos deprimidos
A greve do Instituto Agronômico do Paraná, Iapar, mostra que há bloqueios a aumentos de várias categorias. Se o governo frouxar o garrão nesse campo, a pretexto das liberações da STN, mergulha no inferno fiscal de novo.