Há direitos fundamentais na Constituição e a liberdade de expressão (art. 5º, IX, CF/88) é um deles. No último dia 5 de agosto durante os Jogos Olímpicos foi assinada a certidão de nascimento da ditadura de Temer ao ser explicitada a cadeia de comando cuja ordem era violar o artigo 5º, IX. Temer mandou prender manifestantes que alçassem voz ou cartaz contra ele, e com isto cruzou o rubicão, pois quando a resposta política para o opositor é a prisão, então, o regime definhou. É fim de etapa do golpe, econômico-político, para iniciar outra, ditatorial.

Não foi o primeiro ataque golpista à Constituição, mas este foi à luz do dia, com prisão de homem por ter gritado "Fora Temer" em estádio olímpico. Em tempos de verba volant, hominis captus est, em Minas Gerais o constrangido policial Fabiano ameaçou de prisão a uma mulher por ostentar cartaz contra Temer. Explicação de Fabiano: se não a prendesse seria enquadrado por seus superiores por crime de prevaricação. Isto configura a cadeia de comando de governo golpista temeroso de vaias, pedidos de socorro e exposição pública do golpe. Temer mandou às favas os escrúpulos, rasgou olimpicamente a sua fantasia de democrata para manter arremedo de governo, fajuta imposição pela força bruta. O ditador fala: milagre, mistério e autoridade. O democrata diz: história, esclarecimento e autonomia.

Não está em causa a crítica desde posição ideológica contrária aos aboletados no governo sem votos, senão que o seu obscurantismo inicial foi transformado em ditadura. Está em causa a ultrajante violação de princípios básicos do liberalismo político clássico fundamentador da ideologia dos golpistas, mas acaso renegarão o liberalismo de Locke que previu o direito à resistência civil quando a ordem jurídica é violada?

O debate não está ancorado na pertença ao campo progressista ou neoliberal, à esquerda ou direita, nem a defesa da redistribuição de riquezas e a justiça social. Nada disto. Não estamos mais divididos entre progressistas e neoliberais em disputa por dois projetos distintos de país, que oscila entre a maior e menor preocupação por justiça social. Não há outro modo mais suave de dizer as coisas quando pessoas são presas por levantar a voz ou cartazes contra o governo. Simples, direto e binário: ou somos constitucionalistas ou defenderemos a incipiente ditadura! Não há outra possibilidade ou alternativa nesta encruzilhada da vida brasileira.

Agora é a vez e a hora do neoliberal democrata convicto de pronunciar rotundamente um "não", e não porque concorde com as críticas progressistas. Sua mobilização é devida à violação de suas convicções básicas à luz do dia. Cerrando fileiras, os constitucionalistas dirão "não" à nascente ditadura. Proibido de criticar o governo sob pena de prisão, o genuíno cidadão liberal recém-chegado das ruas de protestos contra Dilma saberá preservar o seu direito de protestar, bater panelas, estender faixas, pintar sua cara, sair em carreatas. Dirá não ao governo que, mal chegado, viola direitos. É chegada a hora de ir às ruas e defender a Constituição antes que nada reste dela.
Ao prender o primeiro homem ,Temer assinou o seu fim. Puro arbítrio configurador do trânsito da violência simbólica para a violência física que o Brasil não aceitará. Sabemos que não há outra opção senão que todos nos assumamos constitucionalistas. A consigna já não é mais "Fora Temer". O grito unido dos constitucionalistas é um só: Fora ditadura!

ROBERTO BUENO é professor pós-doutor em Direito do Centro de Estudos Avançados sobre a Democracia da Universidade Federal de Uberlândia (MG)

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