João Pinto de Oliveira Castro nasceu em 1927 em Ponte Nova, Minas Gerais. Mais velho dos cinco irmãos, perdeu a mãe ainda menino. Seu pai, triste com a viuvez precoce e sem condições de criá-los, distribuiu as crianças entre os parentes. Trabalhando na roça desde pequeno, ele gostava de nadar nos rios da região e por ser rápido dentro d’água ganhou o apelido de João Ligeiro.

Com dezessete anos veio tentar a sorte no Norte do Paraná, desembarcando do trem na Vila de Cornélio Procópio em 1944. Com a derrubada da mata e preparação da terra para a lavoura, trabalho era o que não faltava, e, acostumado à lida, João não enjeitava serviço. Calejado pelas dificuldades, mesmo jovem já tinha prudência, ou seja, era um sujeito que possuía tino, madureza. Mas a gente sabe que até com os sensatos, quando incautos, a vida apronta.

Certa feita, João Ligeiro ganhou um bom dinheiro no plantio de café na Fazenda Tangará. Guardou a grana no quarto da pensão, esperando ansioso pelo sábado para ir à vila comprar tecidos pra calça e camisa, perfume e um par de botinas. Queria ficar bonito para ir ao baile do "puxa-faca" onde estava de namoro com uma linda morena chamada Carmem. Ainda não tinha pedido a mão da moça, mas já fazia planos de casamento, comprar uma bicicleta e, se Deus ajudasse, adquirir um lote de terra. Fez até promessa caso ela o aceitasse: ir à missa todos os domingos, levando-a na garupa da bicicleta.

Imagem ilustrativa da imagem Promessas de João Ligeiro



Na manhã de sábado se dirigia à vila, mas foi chamado a entrar na venda dos Brito, lugar de encontro da turma da roça. João Ligeiro não tinha hábito de beber, mas animado pelos amigos começou a tomar umas "branquinhas" e outras "misturadas". Logo foi pro carteado e passou a tarde jogando baralho. Quando anoiteceu estava embriagado e, desnorteado, foi parar dentro do cemitério onde acabou dormindo entre dois túmulos. Ao amanhecer, acordou deitado sobre uma coroa de flores e ficou desesperado achando que tinha morrido. Confuso, tentava entender o ocorrido e ao sair do lugar levou um tombo, batendo com a cara no chão. Com o rosto coberto de sangue, aos poucos começou a lembrar do acontecido: havia saído da venda cantando serestas e ao se despedir dos amigos errou o caminho e entrou no cemitério. Era o que lembrava. E, também, que amava a Carmem e morava num quarto de pensão.

Pensando nisso, ajoelhou-se em frente ao cemitério, rezou um padre-nosso e fez nova promessa: de nunca mais botar pinga na boca. Pôs a mão no bolso e viu que ainda tinha a metade do dinheiro que havia recebido. Contente por isso seguiu rumo à pensão e nunca mais bebeu cachaça. Comprou a bicicleta, casou com a Carmem e, anos depois, adquiriu o tão sonhado sítio. Na última ida ao médico para tratar de um problema no joelho, que o incomoda desde a queda no cemitério, o doutor elogiou seu estado físico e mental dizendo que aos 90 anos, viúvo, pai de dez filhos, vinte e dois netos e seis bisnetos, Seu João tem uma "saúde de ferro"!
João, sorrindo, respondeu ligeiro: "- Pois é Doutor, com a graça de Deus a madeira aqui é aroeira".

Gerson Antonio Melatti, leitor da Folha