Imagem ilustrativa da imagem AOS DOMINGOS PELLEGRINI
| Foto: Arquivo Folha



A primeira estrela de Londrina é a transformação. Menininho, vi a rua Maranhão, onde nasci, se transformar quando asfalto cobriu os paralelepípedos, que porém ali estavam há poucos anos – e continuam debaixo de muitas ruas, a lembrar que o passado baseia o futuro.
Vi a Higienópolis ainda escura e tranquila, um carro ou outro passando e, ao pé das árvores, as empregadas das mansões namorando. Vi a Madre Leônia estradinha de terra, a TV Coroados cercada de cafezais, e gente a olhar embasbacada a construção do Centro Comercial: "Onde é que vão arranjar gente pra morar nesse colosso?" No Igapó ainda abeirado de capinzal, pesquei onde era curtume e hoje é a Escola de Dança. E a Praça Nishinomiya, deserta durante mais de década, se transformou no espaço vivo de hoje.
Amassei barro no campus da UEL, quando os primeiros prédios eram ilhas de concreto cercados de terra vermelha. Como também foram as casinhas brancas e iguais do Cincão, transformadas até não se ver mais uma igual a outra.
Outra estrela de Londrina sempre foi a ousadia. Colonizadora a criar cidades planejadas no meio da floresta. Fazendeiro a buscar bois na Índia, revolucionando a pecuária nacional, mesmo com oposição até internacional, portanto "coisa de doido". Um prefeito a fazer um lago "lá longe onde ninguém vai". E um empresário a erguer o primeiro shopping do interior do Brasil, o Com-Tour, "mas vai quebrar logo, isso é coisa só pra capitais"...
A terceira estrela de Londrina é a convivência. Formada por gente do país todo e do mundo inteiro, quem aqui nasceu sempre se viu naturalmente entre estrangeiros, negros, mestiços, todo tipo de gente. Racismo ainda existe sim, a ignorância é tão teimante quanto a luz é irradiante, mas racista aqui arrisca ter neto mestiço. Doutor Clímaco, negro como só, já lá nos primórdios foi padrinho de oitocentas crianças, na maioria brancas. Na convivência política, é exemplar Doutor Câmara ter sido comunista declarado e praticante, mas as freiras da Santa Casa dizerem de boca cheia "ah, se todo comunista fosse como ele, todo mundo podia ser comunista"...
A quarta estrela de Londrina sempre foi o renascimento. Isolada na Revolução de 32, renasceu liderada por prefeito paulistinglês, Willie Davids. Capital do Café, podia assim ter desculpa perfeita para se entregar ao deus-dará com a geada de 55, mas a Cacique de Café Solúvel simbolizou seu renascimento agro-industrial. Com a geada de 75, sofreu e inchou mas renasceu como metrópole polivalente.
A quinta estrela, aquela oculta mas implícita na simetria entre as outras, é a resistência. (Lembro do velho comunista Mané Jacinto já bem velhinho, a responder se as torturas não tinham lhe quebrado muito: "Ah, só por fora, por dentro estou inteirinho"...)
Foi a primeira grande cidade do interior do país a votar sempre contra a ditadura. Resistiu à febre amarela, ao barro e ao poeirão, às geadas, a crises e à corrupção. "Pés-vermelhos, mãos limpas!" Agora, a crise começando a acabar, esperemos Londrina resistir à tentação de voltar a crescer sem melhorar. Se gente crescesse sem parar desde que nasce, chegaríamos a dez metros de altura, e que ser disforme seria alguém assim!
Em vez de se tornar metrópole monstro, crescendo só em tamanho, precisamos que nossa cidade cresça em cultura, saúde, limpeza, beleza e prosperidade geral, investindo na educação dos cidadãos de amanhã, desburocratizando para apoiar empreendedores, dispensando privilégios e planejando horizontes. Para nossos netos dizerem que boa e bela Londrina nos legaram, temos orgulho de ser pés-vermelhos - principalmente depois do Tubarão ganhar de goleada o campeonato mundial.