‘O pouco que posso fazer é recebê-los e tratá-los como gente", diz a bancária aposentada Judite de Andrade Zacarkin, que ingressou no Programa Família Acolhedora, em Cascavel (Oeste), há cerca de dez anos. Na primeira experiência, Judite recebeu quatro irmãos destituídos do poder familiar. Eram crianças e pré-adolescentes vítimas de todo tipo de abuso. Uma das crianças, com 12 anos, já era mãe de um bebê fruto de abuso sexual cometido pelo próprio pai. "Quase todos vêm sem limites, sem nenhuma noção de comportamento social, familiar, religioso, educacional. Tem que esvaziar a sacola de coisas ruins para poder encher com coisas boas", compara. "A gente tem que ensinar o básico. Ensinar a dar boa noite, dar um abraço, o contato físico é muito importante para eles."
Os quatro irmãos viveram com Judite por oito anos. O mais velho, hoje, trabalha em um aviário na zona rural do município e tem uma vida independente. Os outros foram acolhidos por outras famílias por questões de segurança. No bairro de Judite há uma área de invasão onde o tráfico de drogas corre solto e ela ficou com medo de as crianças se envolverem com a marginalidade. A menina mais velha, com 20 anos de idade, foi morar com a irmã de Judite, que também faz parte do Família Acolhedora. Os outros dois foram encaminhados a outras famílias cadastradas no programa.
"Eles foram embora, mas me chamam de mãe. Quando saíram da minha casa, dei um álbum para cada um com cerca de 400 fotos cada que mostram todas as etapas do tempo em que viveram comigo. Eles não tinham história. É como se tivessem nascido quando vieram para a minha casa."
Hoje, Judite acolhe um casal de irmãos, com 5 e 8 anos de idade, que passam pelo processo de destituição do poder familiar e em breve deverão estar disponíveis para adoção. As crianças estão com ela há seis meses e participam de toda a rotina familiar, onde aprendem o que é fazer parte de uma família. "Eles vêm com uma bagagem ruim. Se foram tirados da família é porque não era um ambiente bom. Cada um tem um tipo de trauma. Ficam assustados quando deixam a família, que por pior que seja a convivência, é a família deles. Vão para o abrigo e vem outro trauma, ficam assustados porque não sabem o que vai acontecer. Depois vão para a família acolhedora, que são pessoas que nunca viram na vida. O que temos de fazer é apaziguar o coração deles. O que a gente faz é contar um final feliz para a história de vida deles", diz Judite.