Construída em 1949 e inaugurada em 1950, uma bela igreja está abandonada no mato desde a década de 80. Ela fica em terras da Fazenda Bulle, no Patrimônio Regina (Zona Sul de Londrina), que faz divisa com Arapongas, na Estrada do Bulle.
Lendária, a Fazenda Bulle, de dois mil hectares, começou a ser formada ainda no final dos anos 1920. O pioneiro Arnoldo Bulle veio de Monte Verde Paulista, próximo de Bebedouro, interior de São Paulo. Ele era originário de Santa Catarina e filho de alemães.
Hoje, o espólio da fazenda é administrado por um escritório em Londrina. Seguindo uma tendência de toda vida, os Bulle não têm muita disposição em atender a imprensa. Desta vez não foi diferente. Procurado em quatro ocasiões para contar a história do fechamento da sexagenária igreja, um neto do pioneiro não demonstrou interesse em falar com a reportagem.
Sebastião Soares, que nasceu na Fazenda Bulle, é quem revela alguns detalhes. Seu pai, Clemente Soares, foi encarregado por Arnoldo Bulle para começar a abrir a fazenda. Para isso ganhou 50 alqueires. Aos 22 anos, Clemente estava com a família - a madrasta e cinco irmãos - no interior de São Paulo quando foi contratado por Arnoldo Bulle.
''De Montes Claros ele veio para Sertanópolis de trem, em 1928, e já foi fazendo o picadão para os carros de boi passarem em direção a Jataizinho. Ele deu conta da empreita e ganhou os 50 alqueires'' conta Sebastião. Essa terra é hoje a Fazenda Boa Esperança, cuja sede abriga uma igreja que substitui a antiga capela fechada. Elas ficam a 80 metros uma da outra. A padroeira é Nossa Senhora das Graças.
De acordo com Sebastião, um dos netos de Arnoldo Bulle (não especifica quem) ''é meio maçom, não gosta de padre e mandou fechar a igreja. Aí nós construímos a outra deste lado''. Sebastião diz que na época, início de 1988, também foram fechados um campo de futebol e um salão de baile na Fazenda Bulle, ''por conta de umas bagunças''.
A Bulle foi uma grande fazenda, com muitas construções de altíssima qualidade e viveu a fase de ouro da cafeicultura. Depois, com a mudança de culturas e o esvaziamento do campo, casas de colonos, armazéns, escolas, oficinas, casas de administração e outras benfeitorias ficaram sem serventia. Hoje muitas estão abandonadas, mas mostram ainda a qualidade da construção. Um patrimônio histórico de respeito que aguarda - numa eventual parceria público-privada - uma efetiva política de conservação.
A igreja mantém a beleza em meio a uma plantação de eucaliptos, fechada por uma mata secundária. Há oito anos, segundo Soares, um casal de urubus mora no telhado. Num cipoal bem em frente à entrada, um imenso enxame de abelhas Europa se agita à aproximação. ''Um perigo danado'', alerta Sebastião.
No interior da igreja, uma surpresa. A sujeira e os danos mais graves não escondem a beleza dos detalhes arquitetônicos, iluminados pela luz que entra por janelas e portas.
O altar é uma peça respeitável e com graça arquitetônica. Ali, ao lado de uma Bíblia de cimento, a marca de uma cruz de metal arrancada, uma imagem de Cristo e outra de Nossa Senhora das Graças, está uma imagem de um Buda cuja brancura da porcelana destaca as camadas de poeira.
O pioneiro Arnoldo Bulle chegou à região ainda intocada em 1928, para coordenar as derrubadas e plantio dos cafezais. Exemplos como o da fazenda da família há muitos. Elas guardam as estruturas históricas que promoveram o desenvolvimento da região no século passado e esperam a ação dos órgãos responsáveis pela manutenção do patrimônio.