Nos últimos anos, acompanhamos uma grande polêmica sobre o fechamento ou a permanência das casas de bingo e a legalização dos jogos de azar. O videopôquer, jóquei club e outras casas de apostas estão espalhadas pelas cidades, algumas até clandestinas.

O Jogo Patológico (JP), uma realidade pouco conhecida socialmente, tem sido objeto de estudos. É um transtorno psiquiátrico ao qual se atribuem relevantes traços de personalidade, vinculados a dependências substanciais, principalmente ao álcool e tabaco. Classificado no Código Internacional de Doenças CID-10 como ''Transtornos de Hábitos e Impulsos'' .

Alguns pesquisadores e profissionais da área de Psicologia e Psiquiatria veem o JP como uma dependência comportamental, aproximando-o dos transtornos de humor e ansiosos, reconhecido como uma patologia, apenas há alguns anos.

No Brasil, o jogo é aceito com naturalidade como diversão e lazer, nos bingos beneficentes, no jóquei club, no jogo do bicho, e também como um modo de ''enriquecer rapidamente'' através das loterias. O que não se sabe é que a evolução do jogar não patológico para o jogar patológico ocorre traiçoeira e silenciosamente, porque enquanto não se torna patológico as perdas são quase impercebíveis e as desvantagens quase inexistentes. De contraponto, as vantagens são diversamente associadas ao prazer, lazer, aos ganhos, sociabilidade e à fantasia de enriquecimento, efetivando a adicção, o que causa no jogador uma dependência estabelecida pela falta de controle sobre si e sobre as apostas.

As apostas, muitas vezes iniciam-se na adolescência, mas pode ocorrer em qualquer idade em função de conflitos familiares, desejos de consumo, rejeições e perdas de emprego, por morte, separação de entes queridos ou depressão, emoções positivas e negativas, influências culturais, entre outros fatores que são altamente relevantes à adicção ao jogo.

A partir da instauração do problema com o jogo, inicia-se o contato do indivíduo com as desvantagens, perdas sucessivas, ganhos esporádicos e prejuízos, estabelecendo progressivamente o caos na vida desses sujeitos.

O que antes era gratificante, prazeroso, aliviava tensão, dando sensação de poder e de competência, transforma-se num ciclo de atitudes impulsivas e compulsivas. Sentimentos de culpa, angústia, vergonha, arrependimento, euforia, e então o jogador torna a jogar para tentar reparar os danos e prejuízos, e que na maioria das vezes vão se acumulando.

As implicações pessoais, familiares e sociais do jogar patológico são efetivas, causando ao jogador e àqueles com quem convivem, grandes sofrimentos morais, emocionais, físicos (na crise abstêmica, alguns apresentam sintomas semelhantes aos dependentes químicos), perdas materiais e até mesmo problemas com a justiça, marginalização, ou seja, exclusão familiar e social.

O que caracteriza o jogo patológico é a perda de controle e varia em frequência e intensidade, sobre si e sobre as apostas. Os apostadores que já enfrentam conflitos decorrentes do jogo, devem considerá-los como um alerta. Em geral quando o indivíduo procura ajuda é por ter se tornado um ''jogador compulsivo''.

Anaí Licia Couto - psicóloga e psicanalista (São Paulo)