Curitiba - Dez anos após a instauração da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investigou a exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil, o problema está longe de ser solucionado. A conclusão é da então presidente da CPMI e hoje deputada estadual pelo Ceará Patrícia Saboya (PDT). Entre 2003 e 2004, ela coordenou o trabalho dos 48 parlamentares, sendo 24 titulares e 24 suplentes, que receberam denúncias, recolheram depoimentos e propuseram leis, algumas das quais incorporadas ao Código Penal.
"Conseguimos tirar aquele véu que existia sobre o problema, que o tornava invisível, mas ele persiste e tem aumentado cada vez mais. As estatísticas são absurdas. Apesar dos avanços, eu particularmente não tenho visto nada que possa me consolar ou me encantar no sentido de melhorar a situação. Infelizmente ando muito pessimista em relação às políticas para infância e juventude", afirma.
O relatório da CPMI, lembra Patrícia, apontou mais de 800 denúncias, sendo 17 de casos emblemáticos, que tratavam de questões como tráfico, abuso e exploração sexual. "Encaminhamos (o documento) a todos os governos estaduais, tribunais de justiça, procuradoria da república, ao (então presidente) Lula, ao Ministério da Justiça, a esportistas, líderes religiosos e demais autoridades que poderiam de alguma forma desvendar esses casos".
Segundo a parlamentar, as principais conquistas registradas foram no âmbito da legislação. "Conseguimos alterar o Código Penal em muitos artigos. Mudamos o conceito de crimes contra os costumes para contra a liberdade e o desenvolvimento social. E outros tipos penais, como o estupro de vulneráveis (violência contra quem tem menos de 14 anos)", relatou.
A deputada diz também que os integrantes da CPMI se preocuparam em acrescentar punições mais severas para toda a rede de exploração sexual comercial, inclusive para os clientes e os estabelecimentos que hospedam crianças e adolescentes sem a autorização dos pais. "Solicitamos, ainda, a extinção da punibilidade quando acontece o casamento entre a vítima e o agressor. Antes se alguém fosse vítima e se casasse com o agressor, ele se tornava inimputável, ou seja, não era mais responsabilizado. Tivemos muitas dificuldades e encaramos muita resistência, porque o código foi todo construído por homens; nossa cultura é muito machista. Então essa foi uma das maiores contribuições da CPMI".
Em relação à Copa do Mundo e à Copa das Confederações, que serão realizadas no Brasil, Patrícia Saboya faz um alerta. "É claro que somos todos favoráveis, mas desde que haja proteção aos direitos das crianças e dos adolescentes. Senão vamos repetir os erros de outros países que não se deram conta disso e acabaram por explorar cada vez mais a infância". (M.F.)