Edson MazzettoLonga caminhadaA 12ª Romaria da Terra, realizada domingo, reuniu cerca de 20 mil pessoas ‘‘Todo mundo aqui lutou muito e ninguém vai desistir agora’’. A afirmação, de Elza das Neves, 34 anos, dez filhos, resume a posição das cerca de 1,35 mil famílias acampadas na Fazenda Pinhal Ralo (180 quilômetros a leste de Cascavel), no município de Rio Bonito do Iguaçu. Nenhuma das famílias aceita ser incluída na relação de ‘‘excedentes’’ do grupo de novecentas que o Incra quer assentar. O número corresponde à área desapropriada, de 16,9 mil hectares, parte dos 83 mil hectares que formavam a propriedade da empresa Araupel (ex-Giacomet-Marodin).
Os sem-terra se revezaram nos discursos contrários à lista de excedentes domingo, durante a 12ª Romaria da Terra, organizada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), que reuniu cerca de 20 mil pessoas no acampamento.
Elza foi uma das pessoas mais empenhadas na ‘‘conquista da terra’’, e uma das que mais sofreu nesta luta, por isso não aceita ser ‘‘excedente’’. Um de seus dez filhos, Vanderley, 16 anos, foi morto a tiros no dia 16 de janeiro, juntamente com José Alves dos Santos, 35 anos, em crimes que os sem-terra atribuem ‘‘aos jagunços dos fazendeiros’’, sem que até agora haja a definitiva incriminação.

Edson MazzettoSem excedentesElza das Neves e parte dos filhos: terra para todos do acampamentoEmbora tenha ‘‘mágoa no coração’’, ela diz que os tempos são de alegria. ‘‘A gente sempre estava preparada para tudo’’. Elza e seu marido José, 54 anos, são evangélicos e acreditam que a família terá terra pela primeira vez. E querem o mesmo para todos. ‘‘Aqui todo mundo lutou e para nós não existe excedente’’.
No centro do acampamento, agora denominado ‘‘Ireno Alves dos Santos’’ - homenagem ao líder do MST falecido em 96 -, uma cruz encravada durante a Romaria lembra os dois sem-terra assassinados e dezessete crianças que morreram em consequência de desnutrição e problemas respiratórios. A cruz foi feita com pedaços da porteira da fazenda, arrancada na ocupação.
Valdir Pagliari, 30 anos, três filhos, casado com Catarina, 26, diz que não aceitará ‘‘o sonho da terra virar pesadelo’’, se virar ‘‘excedente’’. Valdir cresceu numa família que nunca teve terras. Como arrendatário na região, ‘‘nunca sobrava nada além de um pouco para comer’’.
Agora, além do milho que colheu - foram cem mil sacas no acampamento -, tem uma horta bem cuidada e um barraco ‘‘que logo vai virar casa’’. Valdir afirma que não admite ser frustrado agora. ‘‘Queremos um pedaço de terra para todos que lutaram’’, completa.