"A maioria da população não acredita na recuperação do ser humano; pensa que todos que passam pelo tratamento penal vão voltar a cometer crimes", diz Reginaldo Gabriel
"A maioria da população não acredita na recuperação do ser humano; pensa que todos que passam pelo tratamento penal vão voltar a cometer crimes", diz Reginaldo Gabriel | Foto: Saulo Ohara



Reginaldo Aparecido Gabriel, 35, passou oito anos e um mês preso e desde agosto de 2016 ingressou no regime semiaberto. Desde então, ele concluiu o ensino fundamental e iniciou-se no estudo da teologia. Hoje ele é pastor de uma igreja evangélica em Americana (SP) e faz planos de prosseguir com os estudos para cursar faculdades de teologia e serviço social e poder ajudar ainda mais os fiéis que frequentam a sua igreja. Mas Gabriel conhece bem as dificuldades enfrentadas pelos egressos do sistema prisional. "A maior dificuldade é que a maioria da população não acredita na recuperação do ser humano. Pensa que todos que passam pelo tratamento penal vão voltar a cometer crimes", disse.

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Para ajudar quem acabou de deixar o sistema prisional a reestruturar a vida e a se reintegrar à sociedade, foi inaugurado em Londrina nesta quinta-feira (30) o Escritório Social, que deverá prestar atendimento multidisciplinar, com a oferta de serviços de saúde, qualificação, encaminhamento profissional, atendimento psicossocial, assistência jurídica e regularização de documentação civil. O serviço faz parte do projeto Cidadania dos Presídios, do Conselho Nacional de Justiça, e o escritório de Londrina é o quarto do País. Os dois primeiros foram instalados no Espírito Santo e, no Paraná, já existe em Curitiba.

"O escritório vai dar apoio no sentido de incluir essas pessoas na sociedade, facilitando o acesso às políticas de educação e cursos profissionalizantes para que possam terminar de estudar, terem condições de trabalho e de vida", explicou a coordenadora do Patronato Penitenciário de Londrina, Cíntia Helena Santos. "Não é obrigatório, vão vir para cá aqueles que querem e precisam. As políticas até existem no município, mas as pessoas estão à margem, não têm acesso, não tem quem ajude a traduzir essas políticas públicas e às vezes elas não vão porque não sabem da existência delas", acrescentou.

Uma das maiores necessidades é conseguir políticas de saúde que atendam os egressos, especialmente os dependentes químicos, e de assistência social. "Essas duas políticas a gente já trabalha muito e só vamos ampliar, mas a ideia do escritório é apoiar todas as pessoas, ver se tem alguma política imediatamente que a gente consegue atender", destacou a coordenadora.

A equipe de profissionais já atuava no Patronato e deve ser ampliada. Também contarão com o apoio de estudantes dos cursos de direito e psicologia da Faculdade Pitágoras, como projeto de extensão, e de alunos de um projeto de iniciação científica da UEL (Universidade Estadual de Londrina) na área do serviço social.

Com a ajuda do Conselho da Comunidade de Londrina, o Patronato conseguiu organizar o primeiro curso no Senai, de instalações prediais, direcionado aos egressos do sistema prisional. "Ainda não é do jeito que eu queria porque é uma turma separada para eles, mas é um curso de 100 horas, com diploma do Senai, que dará uma chance de trabalho. Com 20 horas concluídas desse curso, o aluno já consegue pegar pequenos serviços para fazer no bairro dele", apontou Santos. "A gente dá curso aqui, mas o diploma sai como curso do Patronato Penitenciário, o que dificulta muito conseguir trabalho."

"Esse escritório, se funcionar realmente como os olhos das pessoas que estão trazendo esse serviço para cá, vai ser uma fonte de água viva no meio do deserto. A partir do momento em que você coloca seu pé numa unidade prisional, você já se arrepende do que cometeu, mas nem todos têm a oportunidade de consertar aquilo a que se chama de erro", avaliou Gabriel.