Marcelo Oliveira e Eminio Tomaz Netto, no Creslon, conciliam estudo e trabalho
Marcelo Oliveira e Eminio Tomaz Netto, no Creslon, conciliam estudo e trabalho | Foto: Marcos Zanutto



Desde o dia 29 de outubro mais de 20 mil pessoas vivem a expectativa pelo resultado dos aprovados na primeira fase do vestibular 2018 da UEL (Universidade Estadual de Londrina), que será divulgado na tarde desta sexta-feira (17). Entre esses milhares de vestibulandos estão 117 internos do sistema prisional, das unidades um e dois da PEL (Penitenciária Estadual de Londrina) e Creslon (Centro de Reintegração Social de Londrina), que puderam fazer as provas nos locais em que estão encarcerados.

No Creslon há cerca de três meses após vir da PEL 2, Marcelo Renato de Oliveira, 41, prestou vestibular para letras - espanhol. "Estudei muito, porém, mesmo que eu seja reprovado, não vou desistir", destaca ele, que fez o ensinos fundamental e médio dentro do sistema prisional, em que está integrado desde 2006.

Trabalhando com obras e reparos no Creslon, Oliveira usou as horas vagas para estudar. "Como não consegui ter as aulas, peguei cerca de 20 apostilas e estudava durante o horário do almoço e por minha própria conta. A professora do Creslon me passava algumas perguntas que poderiam cair no vestibular e ia resolvendo. Além disso, fazia resenha depois das leituras para que o conteúdo ficasse bem registrado", conta.

Mesmo com um longo período para cumprir no sistema prisional, ele não se abala e sonha com um futuro na área de direito. "Letras é uma porta de entrada para eu fazer o curso de direito. Já penso também em fazer em pós-graduação. Não sei se serei advogado, juiz ou delegado. Mas conseguirei o que almejo e fazendo o que eu gosto", projeta. "Independente do tempo que demorar, quero sair daqui de cabeça erguida e com a ficha limpa", completa.

EDUCAÇÃO E TRABALHO
Neste ano, 22 detentos do regime semiaberto do Creslon prestaram o vestibular da UEL. Desde 2014, quando as provas começaram a ser aplicadas no local, 17 presos entraram para instituição em diversos cursos, como enfermagem, serviço social, ciência da computação e direito. Para o diretor da unidade, Maurício José Sanches, a educação é a principal aliada na ressocialização. "Na hora de resgatar a pessoa do crime, a educação é o principal caminho porque ela abre horizontes e faz enxergar que existe como se recuperar. A educação também é a base para quando deixarem o sistema, porque apoia na hora de procurar um emprego, o que já é difícil na situação de um ex-detento", destaca.

Além do vestibular, o centro de reintegração social oferece a educação de jovens e adultos e cursos profissionalizantes. Atualmente, 150 dos 300 detentos estão estudando, com aulas diárias e em todos os períodos do dia. Em breve, uma cela com computadores com programas de digitação estará disponível para ajudar os estudantes que estão na faculdade. Na UEL, 23 alunos que estudam na instituição são de complexos prisionais, de acordo com a Prograd (Pró-Reitoria de Graduação).

Segundo Sanches, o trabalho é outro pilar na busca por devolver aqueles que um dia cometeram um crime para a sociedade. "Temos convênio com órgãos públicos e empresas privadas, que buscam esta mão de obra, que é mais barata se comparada com o trabalhador comum. Isso faz com que eles tenham responsabilidade e se afastem do mundo do crime. A aceitação da sociedade, porém, ainda é o maior desafio", diz. O salário que recebem, no caso do serviço público, é de R$ 702, que vai para uma poupança em que têm acesso somente após deixar a prisão.

PRECONCEITO
Eminio Tomaz Netto, 29, está preso há mais de seis anos e há um ano estuda letras – espanhol na UEL. "Está sendo muito bom. É outro mundo e estou gostando, pois coloca o 'cérebro para trabalhar'. Por mais que seja um pouco difícil, sei que chegarei até o final", planeja. Ele prestou o vestibular em 2016 após concluir o ensino médio na PEL 1, em que estava antes de ser transferido para o Creslon. Foi o segundo vestibular que prestou. A primeira foi para psicologia, quando passou na primeira fase, mas não na segunda. "Algo me falava que iria dar certo desta vez e deu. Agora concilio os estudos com o trabalho no Creslon, onde passo durante todo o dia ajudando no setor administrativo."

Tomaz Netto diz que não sofreu preconceito dos colegas de classe. "A faculdade representa uma prioridade na minha vida. É o que está me fazendo locomover. Acordo e durmo pensando em como vai ser A aula, o que vou ter que fazer. É uma responsabilidade muito grande esta mudança de vida e é uma resposta pra minha família", ressalta.