Londrina
A recusa do Hospital Ortopédico em atender um paciente mental, sob a alegação de falta de estrutura, obrigou a família de Wagner Antonângelo a enfrentar uma tarde inteira em busca de atendimento. Wagner, de 32 anos, mas com idade mental de cinco, caiu na clínica psiquiátrica onde estava internado na semana passada, fraturando o tornozelo, o peito do pé e dois dedos.
Essa não foi a primeira vez que a família teve problemas para conseguir atendimento clínico para ele. O caso, que acabou na Promotoria Pública, revela a deficiência dos hospitais locais para atender um paciente com problemas mentais.
‘‘Meu irmão é um homem de um metro e oitenta, quase 150 quilos, mas chora e grita como uma criança quando sente dor. Cada vez que ele precisa ir para um hospital sofre a família e sofre ele. As pessoas num Pronto Socorro nem sempre entendem a situação dele e muitos acabam rindo, tirando sarro. Isso é constrangedor porque ele tem direitos como qualquer outro’’, desabafa a irmã de Wagner, Jaqueline Antonângelo. No último dia 22, quando ocorreu o acidente, Jaqueline e a mãe, Marlei, reviveram essa situação por mais de cinco horas.
Diante da resposta negativa do Hospital Ortopédico, Jaqueline seguiu com o irmão, no veículo da Clínica Psiquiátrica Londrina, para o Hospital Universitário (HU). A lotação do Pronto Socorro do HU fez com que eles tivessem que esperar. De lá seguiram para o ambulatório Alto da Colina. Nova espera. ‘‘Tive que fazer escândalo, ameaçar chamar a imprensa e a polícia para meu irmão ser atendido. Mas já estou acostumada’’, diz Jaqueline.
Ela conta que há cerca de dois anos enfrentou situação parecida no HU. ‘‘Só consegui fazer com que ele fosse atendido depois que liguei para vários médicos e um deles ligou para lá autorizando o atendimento’’, ela recorda. ‘‘E a gente sabe que muitas outras famílias passam por esse mesmo problema.’’
Senso realizado esse ano pela Secretaria Municipal de Ação Social revela que Londrina tem 4 mil portadores de deficiências, metade deles com problemas mentais. Mas os números, segundo informações da própria secretaria, mascaram a realidade. Os responsáveis pelo trabalho acreditam que o preconceito faz com que muitos portadores de deficiência - principalmente mental - não sejam incluídos nos números.
O diretor clínico do HU, Sylvio Villari Filho, afirma que as dificuldades para prestar atendimento adequado aos excepcionais são muitas. Ele alega que o problema é a separação de leitos psiquiátricos e gerais. ‘‘Não se vê um hospital que tenha os dois tipos de leitos. E isso é um problema sério porque nos hospitais gerais não temos leitos específicos para atender esses casos’’, afirma Villari.
As dificuldades estão fazendo os representantes do HU pensarem na implantação de um Hospital Dia Psiquiátrico no HU - além de estruturar uma ala de Pronto Socorro para atendimento exclusivo de pacientes psiquiátricos. Mas isso depende da liberação de verba pelo governo do Estado para a continuidade da reforma geral do HU.
Hoje, afirma Villari, os pacientes com problemas psiquiátricos que chegam no HU para atendimento clínico são atendidos como outro qualquer, tendo, inclusive, que esperar conforme a gravidade do caso. ‘‘Não vamos de jeito nenhum restringi-lo de atendimento pela sua condição. Seria discriminação e, como profissionais de saúde, não podemos fazer isso. Mas se não tiver vaga, por exemplo, não tem jeito’’, afirma o diretor clínico do hospital.
Atualmente, o HU oferece, segundo Villari, um suporte com pessoal da psiquiatria e enfermaria psiquiátrica no atendimento desses pacientes. ‘‘O que pretendemos com uma ala exclusiva é dar um pouco mais de conforto a essas pessoas.’’
No Hospital Evangélico, onde Wagner acabou sendo atendido depois da triagem feita no Alto da Colina, também não existe estrutura especial para atendimento clínico de portadores de deficiência mental. Em casos de internamento, segundo informações da assessoria de imprensa do hospital, esses pacientes têm o acompanhamento de uma assistente social e duas psicólogas.
Mesmo sendo atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), os pacientes especiais são liberados para ficar com acompanhantes - o chamado alojamento conjunto, comum no caso de crianças. As enfermeiras, segundo a gerente de enfermagem do HE, Sílvia Cordioli, são orientadas a prestar atendimento diferenciado nesses casos. Por isso, ela diz, o HE nunca teve problemas relativos a pacientes portadores de deficiência mental.
A Santa Casa é outro grande hospital da Cidade que não tem estrutura diferenciada para deficientes mentais. Segundo informações da assessoria de imprensa, o portador de deficiência mental é atendido como outro paciente qualquer. A diferença é o encaminhamento para clínicas psiquiátricas quando o paciente, depois de atendido pelo PS, requer tratamento especializado.
Nenhum dos quatro diretores do Hospital Ortopédico, segundo a secretária da direção, que se identificou por Verônica, quis falar sobre o assunto com a Folha.