Há pouco mais de 10 anos, a Gleba Palhano, na zona sul de Londrina, era mais um vazio urbano, assim como tantos outros espalhados pela cidade. A aposta na verticalização deu certo e, hoje, o bairro concentra não só uma numerosa população, mas também shopping, supermercados, diferentes tipos de comércio, escolas, clínicas médicas, tudo ao alcance fácil dos moradores. Mas nem todas as áreas afastadas do centro da cidade ganharam rapidamente a mesma infraestrutura. Na própria zona sul, muitos condomínios residenciais foram erguidos há vários anos e permanecem distantes dos principais serviços, assim como vários bairros da zona norte. É o que caracteriza a chamada "dispersão urbana".

O geógrafo e professor da Faculdade de Ciências Aplicadas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Eduardo Marandola Junior, explica que as cidades dispersas são um fenômeno urbano e social complexo. Elas podem ser descritas como um modelo diferente daquele consolidado durante o processo de industrialização, período em que a ideia predominante era de que as cidades deveriam concentrar capital, pessoas e conhecimento. "Historicamente, a cidade é associada à concentração. Mas ao longo do século 20, começa surgir uma flexibilização do mercado de trabalho e sistema produtivo. Com o avanço de tecnologias, comunicação e transportes, começamos a ver outro tipo de cidade ser construída", conta.

Marandola afirma que, desde os anos 1970, ocorre uma desconcentração populacional e produtiva das grandes metrópoles e os municípios do entorno passaram a crescer mais que as cidades-sede. "Muitas pessoas foram morar no entorno mesmo mantendo o trabalho e estudos na cidade-sede", aponta. Até então, a possibilidade de habitar em uma região muito distante do trabalho não existia, porque não havia opções de deslocamento. O acesso aos meios de transporte de massa e ao automóvel particular viabilizou essa alternativa. No Brasil, há uma tendência no aumento do uso da mobilidade para acessar serviços e opções de lazer. "Ela está presente em cada vez mais grupos da população", atesta.

Mas as consequências da mobilidade facilitada são diferentes para cada extrato social. O professor explica que, enquanto para a classe alta a possibilidade de deslocamento permite a escolha por habitar em regiões com baixa densidade populacional, para a classe mais pobre, significa ter acesso a novos nichos de trabalho. Porém, ele ressalta que, quanto maior a dispersão, maior é o custo do município para o fornecimento de serviços essenciais. É por isso que muitos estudiosos defendem a urbanização compacta, como a que ocorre em países europeus.

O arquiteto e professor do departamento de Urbanismo da Universidade Federal Fluminense, Werther Holzer, explica que o ideal seria discutir a criação de pequenos núcleos urbanos independentes do centro. Ele diz que, hoje, as pessoas são menos dependentes do transporte público do que há 15 anos. E isso tornou a mobilidade uma questão mais complexa para as cidades. "O transporte ainda é pensado de maneira atrasada", avalia.

O professor afirma que um modelo que funcionaria bem na maioria das cidades é o tronco-alimentador, o mesmo adotado em Curitiba. O sistema consiste na implantação de terminais de conexão em pontos estratégicos nos diversos bairros e em municípios da região metropolitana. Desta forma, a área central não concentra todo o fluxo de passageiros e há um favorecimento de um intercâmbio entre os bairros. Criar meios de transportes descentralizados e retirar a demanda de serviços da área central é o início da solução para amenizar os problemas decorrentes da dispersão urbana.

AS VANTAGENS DA DISPERSÃO
O geógrafo e professor do departamento de Geociências da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Carlos Alberto Hirata, conta que, até meados da década de 1960, Londrina tinha uma população bastante concentrada no quadrilátero central. A partir da década de 1970, começaram a surgir bairros mais distantes, como os jardins Tókio e Leonor, por exemplo. Nos anos 80 e 90, com a chegada de empreendimentos como o Catuaí Shopping, regiões antes vazias passaram a ser ocupadas pela população. Lateralmente, Londrina tem pouco espaço para crescer, mas o professor diz que, nas direções norte e sul, ainda há muitas áreas vazias.

Segundo Hirata, o êxodo rural e a criação das habitações populares que ficaram conhecidas como "Cinco Conjuntos" consolidaram a dispersão urbana na cidade. Dos anos 90 em diante, a zona sul passou a ganhar condomínios horizontais fechados e a receber londrinenses dispostos a pagar mais caro por uma opção de moradia mais segura, próxima da natureza e com o apelo de oferecer mais qualidade de vida. O professor confirma que essa dispersão encarece o custo de urbanização mas, segundo ele, existem algumas vantagens nesse modelo.

"O empreendedor precisa entregar a obra com a infraestrutura completa, com malha viária, redes elétrica e de esgoto. E ele disponibiliza tudo isso para quem está no caminho", pondera. Além disso, há um aumento na arrecadação de tributos, já que os novos moradores passam a recolher os impostos municipais, e também um incremento na geração de emprego, com a mão de obra contratada para atuar dentro dos condomínios. Hirata argumenta que, por um lado, concentrar a população é interessante para ter efetividade nos serviços, mas os vazios urbanos são positivos do ponto de vista da especulação imobiliária. "Se há mais vazios, há mais oferta de lotes e, por isso, preços mais baixos. Em Maringá, por exemplo, o metro quadrado acaba sendo mais caro proporcionalmente ao de Londrina por causa da oferta menor", compara.

HORA DE PLANEJAR O FUTURO
Na avaliação do geógrafo Eduardo Marandola Junior, é necessário repensar o modelo de ocupação urbana. Mas, antes de planejar o futuro, é fundamental envolver toda a população no debate sobre qual cidade se deseja, que tipos de demandas devem ser atendidas. "Adotar uma postura que exclui as pessoas do processo é a pior escolha possível", opina. Para ele, todos os setores da sociedade precisam ganhar voz nesse planejamento.

Londrina já começou a discutir a revisão do Plano Diretor. Para o professor da UEL, Carlos Alberto Hirata, este é o momento ideal para a sociedade participar do planejamento urbano e fazer um enfrentamento real sobre qual Londrina se quer para o futuro. "Está na hora de parar com esse pensamento positivista de que Londrina tem que ter um crescimento populacional diferenciado. A cidade está chegando ao seu primeiro século e municípios com mais de 750 mil habitantes são quase inadministráveis, principalmente se não possuem arrecadação suficiente", argumenta.

HÁ ESPAÇO PARA CRESCER
O diretor de planejamento urbano do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina (Ippul), José Vicente Alves do Soccorro, diz que a primeira constatação a respeito do futuro é a de que o perímetro urbano de Londrina não precisa ser aumentado. "Temos área suficiente para absorver o crescimento populacional pelos próximos 20 anos", garante. Segundo ele, a cidade conta com dois tipos de áreas vazias, aquelas que não foram sequer loteadas e, por isso, possuem grande potencial, e um número considerável de terrenos dentro de áreas já loteadas.

Segundo Soccorro, a densidade demográfica de Londrina é baixa, menos de 100 habitantes por hectare, com exceções de regiões como o centro e a Gleba Palhano, por exemplo. Ele afirma que a verticalização ainda pode ser estimulada, desde que dirigida ao longo dos eixos de transporte de massa e linhas do SuperBus. "O que não pode é a cidade crescer desnecessariamente. Na medida do possível, deve ser compacta, não se espalhar demais", opina. O diretor de planejamento urbano acrescenta que cidades compactas são econômicas, socialmente integradas e mais eficientes.

Entre as questões que serão discutidas no novo Plano Diretor, adianta Soccorro, estão a mobilidade e a possibilidade de formação de pequenos núcleos comerciais e de serviços nos bairros por meio de mudanças nas leis de zoneamento. "A Prefeitura pode, por meio das leis e instrumentos de planejamento, induzir esse tipo de ocupação", afirma. Parte da população mora em regiões mais afastadas do centro porque não tem poder aquisitivo para comprar terrenos mais valorizados. "O município tem o papel de levar até essas áreas serviços públicos, opções de lazer e emprego", completa.