Essa é uma história que começa em seu final. E o ambiente não é dos mais acolhedores. Foi em uma família meio tradicional, meio atípica e meio estranha que nasceu... Wal Carlos. Eu sei, seu nome não era dos mais inspiradores. Ele morreu no dia de hoje e é deste momento que começo a contar sua trajetória: olhando para a sua sepultura no cemitério municipal da cidade.
Se você tivesse ido ao funeral, teria lido na lápide: ''Aqui, neste exato lugar, faleceu, de modo trágico, o grande, brilhante e futuro magnífico poeta Wal Carlos''. O jovem, de talento apontado na própria tumba, parecia mediano, pois escondia suas grandes qualidades, as mesmas hoje enterradas com ele no cemitério municipal.
De suas idéias, de sua arte, de seus poemas, não deixou registro. Wal Carlos exclamava aos quatro ventos: essa arte guardarei para mim. Na cabeça, roteiros de longas-metragens decupados plano a plano. Na memória, quadros iluminados à perfeição renascentista que nunca experimentaram tinta.
Conversava com estátuas e, no cemitério, tinha seus mortos favoritos, com quem, dizem, trocava idéias. Rodrigo Jorge, colega de trabalho, suspeita ter ouvido recitais de poemas que tinha como único público os não-vivos daquele lugar.
O espaço favorito de Wal Carlos nas horas de folga era o mausoléu abandonado da família Plainus. Lá sonhava em cobrir as paredes e a redoma com suas obras e projetar seus vídeos não-filmados. Usaria o local como uma instalação permanente. Imaginava cada detalhe, cada espaço preenchido com uma obra de arte sua.
Wal Carlos jurava que somente materializaria a sua arte quando esta chegasse à sua maturidade. Morreu antes. De morte esquisita, mal explicada. Era coveiro e foi de pá que se foi, caindo no lugar certinho, onde permanece.