Imagem ilustrativa da imagem Você já viu a Lua hoje?
| Foto: Shutterstock



Uma das coisas que você tem que saber sobre São Paulo, se algum dia você se aventurar por lá, é que a Paulista começa no Paraíso e termina na Consolação.

E era por lá — pela Rua da Consolação — que meu amigo Jonas estava passando, 25 anos atrás. Fim de tarde, começo da noite. Aquele período do dia que os americanos chamam de happy hour, mas que por algum motivo, em mim, sempre causa certa melancolia. Dizem que eu nasci mais ou menos nesse horário, lá mesmo em São Paulo.

Mas, como eu ia dizendo, meu amigo Jonas — que tem nome de profeta — passava pela Rua da Consolação. Devia estar próximo às esquinas dos bares que tanto frequentei: o Sujinho e o Riviera. Jonas dirigia o seu Gol GTI (na época, um carro bacana). Jovem prodígio, comandava duas empresas de comunicação, vestia terno e gravata de boas marcas. Mas, como todo paulistano típico, andava estressado. Parou no último farol da Consolação, antes de entrar na Avenida Rebouças.

Foi quando, ali mesmo diante do Riviera (o bar onde deixei meus últimos resquícios de militância socialista), ele apareceu. Alto, barba e cabelos compridos, coberto com um manto, o homem se aproximou do carro. Automaticamente, Jonas levou a mão à carteira, mas constatou que não tinha sequer uma moeda. Só cartões e documentos. Abriu o vidro e disse ao mendigo:

— Desculpe, não tenho nada.

O homem apenas sorriu. E disse:

— Amigo, você já viu a Lua hoje?

Surpreso com a pergunta, Jonas respondeu:

— Não vi, não. Nem dá pra ver a Lua no meio desses prédios.

— Pois é, amigo. Mas ela continua lá. Se puder, dê uma olhada nela hoje. Está muito bonita.

— Tudo bem. Vou fazer isso.

— E, quando conseguir ver a Lua, lembre-se: nunca diga que não tem nada. Você tem tudo.

Nesse momento, o sinal se abriu.

— Vai com Deus, amigo.

— Fique com Ele.

Quando Jonas virou à esquerda, na direção da Rebouças, imediatamente viu a Lua. Estava lá, como o mendigo havia prometido: alta, enorme, brilhante, linda.

Meu amigo Jonas desceu a Rebouças aos prantos. Nunca mais foi a mesma pessoa.

*******
— Fala, Paulão!

Era o que meu pai sempre dizia nos finais de tarde, ao me encontrar aqui na casa de Atibaia.

Então ficávamos tomando cerveja — ele, quase nunca mais de uma latinha — e conversando até a hora do jantar. Ele tinha a mania de colocar o copo de cerveja por 10 segundos no micro-ondas, para "quebrar o gelo". Medo de amigdalite.

Agora estou sozinho na casa. Não tem cerveja na geladeira, mesmo porque não haveria graça nenhuma em beber.

É noite. Mas a saudade tem a incrível capacidade de também ser alegre.

Obrigado, Senhor, pelo pai que tive. E que tenho.

Eu tenho tudo.