Imagem ilustrativa da imagem Verão em Londrina
| Foto: Luciano Schmeiske Pascoal



Vocês verão muitas coisas em Londrina, meus amigos. Tantas coisas que nem cabem na crônica. Seria preciso escrever um livro, um livro inteiro, ou talvez uma coleção de livros, ou talvez uma biblioteca — para dizer tudo que verão em Londrina.

Se vocês têm olhos para ver, verão. Verão o calor quase insuportável das manhãs e dos meios-dias, mas também verão as tempestades bíblicas que se precipitam no final da tarde, como um rio amazônico suspenso sobre nós.

Vocês verão as ruas molhadas e as paralelas dos carros que um dia Belchior cantou, mas também verão o vendedor de espetinhos erguer orgulhosamente o produto do seu trabalho como um general que brande a espada ao final da batalha: "Vim, vi, venci". O meu é de boi, por favor.

Vocês viram, vocês verão. E deverão saber que ao final da tarde um grupo de amigos reacionários encontrar-se-á em um bar incógnito do Parque Guanabara, enquanto em algum lugar da eternidade os fantasmas de outros tempos e outros botecos também se reúnem para beber cerveja e jogar conversa fora. Há bares de tempo e bares eternos. Verão ambos.

Nunca verão um céu como este, que no espaço de algumas horas se transmuda de azul cintilante para branco revoltoso, e dele para cinza sinistro, e dele para vermelho em fogo, e dele para água, provando assim que as cores também podem se transformar em elementos da natureza. Recebam as águas de janeiro que batizam a cidade, ó londrinenses. E, quando receberem, verão.

Se por acaso estiverem sem dinheiro, e é quase certeza que estejam, deverão passar as férias por aqui mesmo. Triste aquela sensação de que quase todo mundo viajou ou está na praia ou emendou férias coletivas, não é? Mas não se desesperem! Deverão sentir alegria, porque gente sem grana também é gente, e férias de londrinense tem os seus encantos. Aqui verão o verão.

Quando cheguei à cidade, em 1989, era verão. Chovia. Peguei o 305 na Rua Humaitá (naquele tempo a Humaitá tinha duas mãos) e foi uma batalha para conseguir um lugar no ônibus lotado. Desci no ponto errado e fui caminhando pelo campus, sob a garoa, até o local de minha primeira aula. "I’m singin’ in the rain/ Just singin’ in the rain…" Fui cantando para espantar a raiva e também porque não sei assobiar. Carregava uma aspirina no bolso da camisa. Tomei-a para não ficar resfriado e também porque estava de ressaca (muita cerveja no Zero Grau na noite anterior).

Desde aquele verão, eu vi. E vocês verão. A alma da cidade é o calor, o calor do coração. Sabem aquele vermelho de fogo que vocês viram? É a nossa terra subindo para o céu. É a velha floresta que ainda arde. É a dor e a alegria e a glória na alma dos pioneiros, o sangue que corria em suas veias e agora corre, feito um rio de lava, para a memória, verão eterno dentro de nós.

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