Na Idade Média, a rotina diária era marcada pelo som dos sinos, anunciadores de todas as notícias, boas ou não: nascimentos, mortes, casamentos, batismos, guerras, tréguas, vitórias, derrotas, festas, colheitas, visitas e procissões. O historiador Johan Huizinga conta que o prestígio dos sinos era tão grande que o povo lhes dava apelidos carinhosos. O badalar dos sinos ainda é ouvido nas cidades modernas, mas não com a mesma regularidade. Eles foram substituídos pelo jornal — e por personagens que encontramos todos os dias.

Durante um tempo de minha vida, encontrei diariamente os dois zeladores do Edifício Palácio do Comércio, em Londrina: o Sr. Luciano e o Sr. Mercúrio. Embora sempre estejam próximos um do outro, eles são bem diferentes. Sr. Luciano é simpático e sorridente; Sr. Mercúrio é caladão. Sr. Luciano usa sempre terno e gravata; Sr. Mercúrio não usa. Sr. Luciano está sempre em movimento; Sr. Mercúrio, embora pareça pronto para voar, está sempre na mesma posição. Sr. Mercúrio aponta para o céu; Sr. Luciano indica os andares corretos.

Imagem ilustrativa da imagem Sr. Luciano e Sr. Mercúrio
| Foto: Divulgação/Acil



A principal diferença entre o Sr. Luciano e o Sr. Mercúrio reside no fato de que o primeiro nasceu em Londrina, em 1937, pelas mãos de Deus; e o segundo nasceu em Campinas, em 1941, pelas mãos de um escultor cujo nome será revelado em breve por dois jornalistas de nossa cidade. Luciano Ferreira Durães, o primeiro zelador do Palácio do Comércio, é um ser humano de carne, osso e simpatia. Mercúrio, o deus greco-romano dos mercadores e mensageiros, é uma estátua de bronze. O mesmo bronze dos sinos medievais.

Quando queremos compreender uma cidade, devemos procurar sempre o seu mito fundador. Roma teve Rômulo e Remo, os irmãos alimentados por uma loba; Londres ergueu-se sobre uma antiga fortificação romana chamada Londinium; Lisboa teria sido fundada pelo herói grego Ulisses; São Paulo começou com uma escola, o colégio erguido pelos padres jesuítas Manuel da Nóbrega e José de Anchieta. A nossa Londrina teve dois mitos fundadores: a chegada da primeira caravana, liderada por George Craig Smith, em 21 de agosto de 1929, e a reunião de 19 pioneiros que fundaram a Associação Comercial de Londrina, hoje Acil, em 5 de junho de 1937. Surpreendentemente, os mitos de Londrina e São Paulo correspondem à mais pura verdade. O que nós somos hoje foi definido por aqueles dois eventos históricos.
Londrina nasceu como empresa, e seu destino manifesto está no espírito de união e trabalho, encarnado em homens como o Sr. Luciano e simbolizado em mitos como o de Mercúrio. Por uma dessas incríveis coincidências que são tudo, menos coincidência, o zelador do Palácio do Comércio e a Acil completam 80 anos em 2017. Neste ano solene, os funcionários fizeram uma homenagem ao Sr. Luciano pelos relevantes serviços prestados ao longo das últimas décadas.

Por isso, não me pergunte por quem os sinos dobram: eles dobram por Londrina.