Imagem ilustrativa da imagem O enigma da Madre Leônia
| Foto: Paulo Briguet



No início da rua de minha santa, cujo nome oficial é Avenida Madre Leônia Milito, há duas árvores imponentes, plantadas em um pequeno declive gramado, que oferecem sombra e acolhimento aos passantes. Quase todos os dias eu sou um desses passantes; foi assim que fiz a imagem que ilustra a coluna de hoje. Peço perdão pelo meu amadorismo fotográfico.
As árvores gêmeas (assim eu as apelidei) devem estar ali desde o tempo em que a Avenida Madre Leônia se chamava Rua Quito. Meu amigo Jorge, morador da região há 49 anos, lembra que o lugar chamado Bela Suíça, vizinho do nosso Guanabara e hoje repleto de casas bonitas, era um imenso bosque de eucaliptos. Jorge e sua avó vinham recolher lenha nesse bosque que não existe mais. No ponto onde hoje se ergue a Igreja São Vicente de Paulo e o padre Rafael encanta a todos com seus belos sermões, existia uma escola católica chamada Frederico Ozanam. Foi lá que Jorge, aos cinco anos, teve aulas com a própria Madre Leônia, futura santa de Londrina.
Sempre existe uma árvore perto de nós. Lembro que na AABB de São Paulo havia uma castanheira gigantesca, ocupando a circunferência de uma praça. Nessa praça havia a barraquinha do vendedor de doces. À sombra da castanheira, na manhã de um sábado, ele se negou a me vender um chocolate. Disse que eu poderia levar tudo que quisesse, sem pagar. "Menino, seu pai me salvou a vida!", disse o homem, que trazia as marcas da cobaltoterapia no rosto. Nunca saberei o que meu pai fez por aquele vendedor de guloseimas. Talvez a castanheira saiba.
Quando Jesus faz os seus primeiros discípulos, o desconfiado Natanael pergunta: "Donde me conheces?" A resposta de Jesus é enigmática: "Antes que Filipe te chamasse, eu te vi quando estavas debaixo da figueira". Até hoje os teólogos essa passagem, mas o fato é que Natanael exclama logo em seguida: "Mestre, tu és o Filho de Deus, tu és o rei de Israel" (Jo 1,48-49).
Em 1896, meu bisavô Antônio, quando era um menino solitário e abandonado pela família em Belém do Pará, olhou para a multidão das árvores amazônicas e disse a si mesmo: "A floresta é grande, mas Deus é maior".
As árvores gêmeas da Madre Leônia me fizeram lembrar um dos poucos livros que apresentei a meu pai (geralmente era ele que me indicava livros). Trata-se de "O Enigma da Chegada", de V. S. Naipaul, em que ele narra sua mudança para uma região rural da Inglaterra, com um estilo literário admirável.
Releio as páginas de Naipaul em busca de uma resposta: qual seria o enigma de Madre Leônia para mim? Talvez aquelas duas árvores simbolizem a presença eterna de meu pai e minha mãe; talvez representem a dupla consolação da família e da palavra; talvez indiquem a harmonia entre fé e razão. De qualquer maneira, acho que as árvores gêmeas dizem que Alguém teve compaixão de nós, retirando-nos do triste estado da não-existência. Elas também dizem que não, você não está só.

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