Imagem ilustrativa da imagem Itinerário de um leitor
| Foto: Paulo Briguet



Um amigo me pergunta quais são os meus dez poemas preferidos no último século. Para responder adequadamente, é necessário não pensar muito e usar a intuição.

O primeiro que vem à mente é "Burnt Norton", de T. S. Eliot (1888-1965): "O tempo presente e o tempo passado/ Estão ambos talvez presentes no tempo futuro/ E o tempo futuro contido no tempo passado./ Se todo tempo é eternamente presente/ Todo tempo é irredimível." (Tradução de Ivan Junqueira.)

Os versos proféticos de "A Segunda Vinda", de W. B. Yeats, escritos em 1919, revelam a face do nosso tempo: "Está solta no mundo a simples anarquia;/ Está solta a maré escura do sangue, e em toda parte a cerimônia da inocência se afogou;/ Falta aos melhores convicção, enquanto os piores/ Estão cheios de ardor apaixonado". (Tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos.)

Não poderia faltar a sabedoria cristalina de D. Antonio Machado: "No desdeñéis la palabra,/ poeta. El mundo es ruidoso/ y mudo: sólo Dios habla".

No belíssimo "Em Memória de W. B. Yeats", temos um grande poeta — W. H. Auden — louvando um genial colega de ofício: "Ele se foi bem no rigor do inverno: /Os riachos estavam congelados, os aeroportos quase desertos,/ E a neve desfigurava as estátuas públicas;/ O mercúrio baixava na boca do dia agonizante". (Tradução de José Paulo Paes.)

"Mensagem", de Fernando Pessoa, lançado quase no mesmo dia da fundação de Londrina, acende a esperança de que o novo império lusíada venha pela cultura: "Deus quer, o homem sonha, a obra nasce./ Deus quis que a terra fosse toda uma,/ Que o mar unisse, já não separasse./ Sagrou-te, e foste desvendando a espuma".

Há 100 anos, Giuseppe Ungaretti rabiscava seus poemas nas trincheiras da Primeira Guerra: "Encerrado entre coisas mortais/ (Até o céu estrelado findará)/ Por que grito Deus?" (Tradução de Geraldo Holanda Cavalcanti.)

No "Romanceiro da Inconfidência", ouço a voz de Cecília Meireles, que me acompanha desde a infância nos livros escolares: "Liberdade — essa palavra/ que o sonho humano alimenta:/ que não há ninguém que explique,/ E ninguém que não entenda".

"A Mesa", de Carlos Drummond de Andrade, e "Vou-me embora pra Pasárgada", de Manuel Bandeira são os meus versos preferidos dos nossos maiores poetas. Parece que estou a voz grave de meu pai recitando, poucos dias antes de partir: "E quando estiver mais triste/ Mas triste de não ter jeito/ Quando de noite de me der/ Vontade de me matar/ — Lá sou amigo do rei —/ Terei a mulher que eu quero/ Na cama que escolherei/ Vou-me embora pra Pasárgada".

A boa notícia, amigo, é que você pode encontrar todas essas preciosidades na nossa Biblioteca Municipal. "Pasárgada tem tudo, é outra civilização."

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