Todo ano nos visita o Outono. Gosto de mencioná-lo assim, em letra maiúscula, como se fosse uma pessoa. O mesmo faço com as outras estações: o Verão (esse intratável), o Inverno (que às vezes não dá as caras) e a Prima Vera. Vivaldi, o padre compositor, homenageou as quatro estações nos seus famosos concertos, que podem ser ouvidos em qualquer época, faça chuva ou faça sol. Muitas são as bênçãos harmônicas do sacerdote italiano.

Todas as coisas têm o seu Outono. Eu diria mesmo que a realidade do universo é inevitavelmente outonal. A origem da palavra é misteriosa; sabemos que vem do latim "autumnu", de significado obscuro. Dizem se tratar de um termo de origem etrusca, mas não se vai muito além disso. Ficamos na mesma. Talvez Outono seja um sinônimo de ocaso, poente, pôr-do-sol, aquele momento mágico cujas cores, dignas de um Monet, conhecemos muito bem aqui no Norte do Paraná. É a preparação para um inverno que nem sempre chega. Não deve ter sido por acaso que o Padre José Kentenich escolheu o Outono para visitar Londrina e Jacarezinho, há exatos 70 anos.

Há um Outono em todas as coisas, em toda a criação. Os físicos chamam isso de "entropia". Mas o Outono dos seres não é apenas uma estrada para a morte; além do limiar, esperamos um retorno, e o nome que damos a essa esperança é ressurreição.

Imagem ilustrativa da imagem Folhas do Outono
| Foto: Paulo Briguet



Não sei se vocês sete estão informados, mas o Outono brasileiro começou precisamente às 7h29 da última segunda-feira. As águas de março, que Tom Jobim imortalizou em sua canção, selaram o fim da estação quente. O calor deve continuar, porque há um verão oculto em cada dia londrinense, mas há também um vento novo, uma luz nova sobre todas as coisas. Os dias tendem a ficar progressivamente menores, e as noites um pouco mais longas. Se prestarmos atenção, sentiremos uma estranha mistura de alegria e angústia nos finais de tarde. Há um Outono em nós. Não é à toa que ele sempre começa no período da Quaresma.

Sei que a minha professora de português Cidinha Baracat já está ficando brava com essa minha insistência em grafar Outono com inicial maiúscula. Mas é que não consigo deixar de vê-lo como uma presença pessoal, professora! Penso mesmo que o Outono tem voz, olhos, ouvidos, uma biografia. Lembro-me da canção "Folhas de Outono", imortalizada por Edith Piaf, Yves Montand, Nat King Cole, Miles Davis, Dave Brubeck e tantos outros. E pensar que há 15 anos visitei Piaf e Montand, em suas moradas no Père-Lachaise. Um dia eles cantaram, antes que o Outono os levasse: "Folhas caídas, pela janela/ Folhas de outono em sangue e ouro/ Vejo seus lábios, beijos de sol/ Tomo suas mãos, beijos de sonho".

E por fim outro padre, santo e sábio, escreveria em seu caderno de pensamentos: "Já viste, numa tarde triste de outono, caírem as folhas mortas? Assim caem todos os dias as almas na eternidade. Um dia, a folha caída serás tu".

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