Imagem ilustrativa da imagem Carta a um amigo que foi tão cedo
| Foto: Arquivo pessoal



No dia 20 de setembro, às 17h04, recebi pela internet uma mensagem do meu amigo Márcio Araujo:

"Oi Paulo, tudo bem, querido? Estou internado desde sexta com uma pneumonia, minha situação não é boa, respiro com ajuda de aparelhos. Hoje depois de muitos anos recebi a comunhão e foi de longe o momento mais maravilhoso da minha vida, estou me sentido com uma paz imensa e queria dividir essa alegria com você."

Marcinho, como quase todos o chamavam, escreveu essas palavras tão generosas dentro de uma UTI. Que ele tenha desejado compartilhar comigo esse momento único é um daqueles acontecimentos que fazem valer todos os sacrifícios desta vida. Quando eu disse que estava rezando por ele, a resposta foi ainda mais emocionante:

"Não sei o que vai acontecer, mas senti a maior paz e alegria que já senti mesmo todo lascado. Boa parte disso devo aos seus textos, em especial, o da Cidade sem Deus. Sempre penso nele. Logo estaremos tomando uma na Toca."

Infelizmente, não pudemos tomar essa cerveja na Toca do Bode (o nosso bar). Na última sexta-feira, Marcinho partiu, após lutar bravamente contra um linfoma. Tinha apenas 32 anos — quase a idade com que, segundo Tomás de Aquino, todos nós vamos ressuscitar um dia.

Durante todo o tratamento, Marcinho se manteve como sempre foi: a Alegria em pessoa. (Alegria assim mesmo, em letra maiúscula, como gostava C. S. Lewis.) As sessões de quimioterapia viravam motivo para piadas impagáveis e observações espirituosas. Lembrei-me de meu pai, em 2008, que sempre saía da quimioterapia no mesmo estado de espírito: sorridente. Depois de uma sessão, fomos caminhar em volta do lago. Foi a última conversa que tive com meu pai.

Marcinho era formado em jornalismo na UEL, mas não exercia a profissão. Usava seu talento como designer em uma empresa da cidade. Éramos ambos alunos do professor Olavo de Carvalho, a quem devemos muito de nossa formação intelectual e espiritual. "Paulo, diga ao Olavo que mesmo doente eu estou comemorando o aniversário dele", disse-me ele, quando o filósofo completou 70 anos.

Além de meu pai e do Olavo, a figura do Marcinho me faz pensar no grande escritor Henry Miller. Ele e o autor de "Trópico de Capricórnio" possuíam o mesmo magnetismo pessoal, a mesma capacidade de fazer amigos, o mesmo amor pelas mulheres, a mesma verve.

Fico muito feliz que Marcinho tenha vivido, antes de partir, o momento luminoso da Eucaristia. Eu sempre digo que a diferença entre a refeição comum e a comunhão é que, naquela, o pão se transforma em você; nesta, você se transforma no pão. Marcinho não morreu: transformou-se no pão da vida.

Compartilho com Chesterton a ideia de que uma vida cristã não é incompatível com uma boa cerveja. Por isso, Marcinho, eu espero tomar uma com você, depois que cumprir a minha tarefa por aqui e passar algum tempo no Purgatório, pagando por meus muitos pecados. Um dia, brindaremos mais uma vez, não na Toca, mas no Céu. Enquanto isso não acontece, seja feliz aí na Cidade de Deus, e interceda por nós.

Sempre alegre e vivo, Marcinho!

Fale com o colunista: [email protected]