Vossa Excelência, a palavra
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quinta-feira, 07 de dezembro de 2017
Por Marco A. Rossi
Os bons dicionários da língua portuguesa registram mais de uma dezena de significados para o vocábulo "palavra". Identificam sinônimos, coletivos e variantes também. Nos exemplos capturados na literatura, a palavra aparece como ingrediente mágico dos grandes clássicos e desejo de consumo dos escritores novatos.
De origem grega e incursão pelo latim, a palavra é elemento do discurso, da lei e da paixão. Graças a ela, as pessoas se entendem. E por conta de suas travessuras, indivíduos e povos inteiros se desentendem. A palavra é história, natureza, cultura e poder. A palavra, sem exageros, é tudo.
O fato incontestável é que a palavra é uma excelente companhia. Ilumina ideias, fortalece argumentos e desbrava o cotidiano. Presente em livros, filmes, discos e no conjunto de sinais que a vida produz, a palavra é a mais sofisticada realização humana. Sem ela, coração e mente distraem-se na escuridão.
A beleza da palavra é destaque nos manuscritos cheios de estilos e curvas, caprichosamente destinados àqueles de refinado gosto. A formosura da palavra pode ser apreciada nos contornos poéticos dos versos ou na sonoridade da voz. Se o belo é a face da imortalidade, como queriam os profetas do passado, é na palavra que repousam as melhores alternativas para um futuro que faça valer a pena o momento presente. Quando capaz de narrar as interconexões entre passado, presente e futuro, a palavra se converte em dádiva. Passa a ser, de bom acordo com Walter Benjamin, espírito e matéria da esperança.
Nada, entretanto, substitui a palavra em sua dimensão ética, naquilo que ela expressa como princípio e possibilidade. A mais elegante das aparências ou o mais delicado dos gestos (o lado estético da palavra) se perde quando a palavra é pequena, desleixada, inoportuna. A palavra emoldura a beleza plástica, oferecendo-lhe uma arte-final exclusiva. O sorriso arrebatador, o olhar penetrante e o toque catártico, cabe à palavra eternizá-los. Em si mesmo, o visível é somente ilusão.
A política, tão surrada e esvaziada no atual e conturbado cenário global, reivindica a palavra para ser democrática. Na ausência da palavra democrática, aliás, brotam fascismos e práticas de exceção. Basta notar: a palavra autoritária é sempre expressa em caixa-alta, aos berros e solavancos; impõe-se pelo medo, cospe ódio, mas nunca exalta valores solidários e universais.
Existem artes na palavra: nos contos densos e precisos a um só tempo; nas crônicas que insistem dominar o tempo tratando das coisas simples e vibrantes do dia a dia; nos poemas que sensibilizam e revelam o que há de melhor nos sujeitos; na prosa longa ou curta, pesada ou leve, casta ou sensual, contida ou revolucionária. Há palavra até onde só se veem traços, cores ou notas musicais são as letras da alma em movimento.
Marco A. Rossi é sociólogo e professor da UEL - [email protected]