Imagem ilustrativa da imagem Os sinais da crise


A palavra crise (do grego "krinein") designa separação, rompimento. Em geral, é associada a uma situação-limite, na qual um cenário de desolações e incertezas abriga a vida comum. A ideia de crise, contudo, pode também reorganizar sentimentos de esperança e inspirar novas formas de conhecer o mundo e nele agir politicamente. Nesses termos, a crise não deve levar ao desespero; antes, deve promover juízos críticos e habilidades para o bom discernimento.
Em situações de crise (quando o sentido da incerteza se sobrepõe ao da esperança), uma palavra recorrente é reforma, que designa, em termos políticos, um conceito fraco, que supõe melhorar aquilo que está ruim e, se possível, restabelecer configurações originais de um sistema, de uma dada realidade. Reformar, em termos sociais, é tentar resgatar a plena funcionalidade daquilo que já se mostrou frágil e requer, portanto, uma boa revitalização para seguir em frente por mais um tempo. A sabedoria popular é implacável: trata-se, via de regra, de passar verniz em madeira podre ou tapar o sol com a peneira.
Se a proposta, por exemplo, for a de reformar estruturas de um Estado nacional, é fundamental revelar quais serão as personagens atingidas, quais serão os cenários alterados. Isso é indispensável porque a história se move continuamente e a possibilidade de retorno ou avanço no tempo sem destituir direitos nem provocar prejuízos é nula.
Parte do aspecto fraco da expressão reforma, portanto, dá-se por seus critérios quase sempre injustos de eleger aqueles que deverão ser sacrificados para que atualizações e ajustes sejam realizados. No Brasil contemporâneo, o discurso político oficial adotou a palavra reforma como emblema de sua atuação na vida nacional. A questão é que reformas não democráticas (ou seja, mais fracas ainda) visam somente a atacar o mal pela galha, sem sequer tocar na sombra das raízes.
Alardeia-se que não há como sustentar o Estado brasileiro, que as contas não batem: gasta-se mais do que se arrecada. Mas, afinal, gasta-se exageradamente com quem e em quê? Seriam democráticas reformas que alterassem a organização do mundo do trabalho e da previdência social sem ouvir os trabalhadores? Do mesmo modo, o que esperar de reformas no sistema de ensino que se revelam alheias ao que fazem professores e desejam alunos, pais e comunidade escolar? É razoável que essas ações sejam assumidas por sujeitos eleitos por mecanismos que perpetuam distorções na representação da diversidade social e beneficiam velhos caciques e coronéis? A essas perguntas os artífices do reformismo em curso - essencialmente fracos e nada democráticos - respondem com silêncio e dissimulação.
Crises anunciam que um tempo está morto e seu substituto ainda não foi visto no horizonte. Tentativas de superação, portanto, podem ser muito fecundas para o fortalecimento político de indivíduos e grupos sociais interessados em protagonismo efetivo nos espaços públicos. Acima de tudo, crises podem motivar novas formas de conhecer a realidade, interpretar o mundo e agir coletivamente – em sentido forte e amplamente democrático. É do que dependem o agora e o amanhã.

Marco A. Rossi é sociólogo e professor da UEL
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