Charada: O que o Jogo da Baleia Azul, o menino do Acre e esse post tem comum? #Mistério

Se aconchega que tem segunda parte da história sinistra do Bosque Central e um episódio bizarro com ilustração da artista paulistana Vanessa Amy.

Boa Leitura!!

Abraços,

Patrícia Maria


A COISA NO BOSQUE - PARTE 2

"Numa noite normal, ao voltar da faculdade, passei no apartamento de uma amiga. Precisava de ajuda com um trabalho. Quando saí já era meia-noite, pensei em chamar um Uber, mas havia um ponto de táxi do outro lado do Bosque, eu sabia. Por isso decidi atravessá-lo, afinal tanta gente passa por ali, por quê logo comigo aconteceria alguma coisa? Atravessei a rua e comecei a passar pelo bosque, lembro que era lua minguante, ela nem aparecia direito no céu, havia algumas pessoas passeando com seus cachorros nas ruas em volta. Isso me dava uma certa segurança, mas não fiquei pensando muito. Minha mãe sempre diz que quem pensa demais não faz.

"A noite era fresca e agradável, e o bosque nem tinha aquele cheiro horroroso de fezes de pombos que já faz parte da sua identidade. Parte de suas típicas luminárias em forma de globo não funcionavam no momento, espalhando escuridão. Mas eu atravessava calmamente, ciente de que as partes mais internas das árvores eram habitadas por gente de todo tipo, mesmo tendo uma guarita de polícia em um dos cantos da travessa. Não caminhei metade do que precisava para concluir o trajeto, quando uma estranha sensação me tomou por inteiro, um calafrio intenso, uma queimação na nuca e nas orelhas. Sabia que havia alguém por perto.

Apressei o passo. Estava prestes a sair do outro lado do Bosque, quando uma luminosidade estranha me chamou a atenção, e tenho esse terrível defeito de ser curiosa demais. Era como uma luminescência esverdeada num arbusto entre as enormes árvores. Diante dele havia uma figura que não pude distinguir se era homem ou mulher. Estaquei, observando a luz e a figura em questão. Olhei por toda parte, por entre as árvores, pelo caminho, e para as ruas ao redor, me certificando de que não havia gente mal intencionada tentando armar algum assalto ou coisa pior. Nenhum sinal de vida.

"Segui em frente.

(Ilustração: Vanessa Amy)
(Ilustração: Vanessa Amy)



"Um passo de cada vez, agora mais devagar, fui me aproximando da saída do bosque, quando pude ouvir o que a figura falava, olhando para o arbusto esverdeado. Não consegui entender muita coisa, mas ela repetia uma frase comprida que terminava mais ou menos assim: ‘Cthulhu R'lyeh wgah'nagl fhtagn’. Nem sei de que espécie era o arbusto, mas me lembrou, não sei porquê, a sarça ardente a se comunicar com Moisés no Antigo Testamento.

A luz fraca, verde, não se movia, antes escorria pelos troncos e galhos. Senti minha pele arrepiar, minha espinha, todos os meus ossos, como se quisessem que eu sumisse dali o quanto antes. Má sorte não ter acreditado na minha intuição! O estranho me viu, seus olhos eram tão verdes e luminescentes quanto a substância na planta. Praguejou indistintamente e correu. Só tive condições de ver que ele havia corrido rumo ao acesso do subsolo da catedral.

Mesmo com os nervos gritando de medo, me aproximei do arbusto, olhando bem a camada verde luminescente, e, nesse exato instante, vi formar uma espiral opaca entre os galhos da planta e um tipo de rosto nefasto surgiu na espiral. Fiquei horrorizada ao ver que não era um rosto de gente ou de animal, o que por si só já seria assustador! Era um rosto monstruoso, tinha o aspecto de uma cabeça horrenda de polvo, com todos aqueles tentáculos e um olhar sombrio e aterrador. Me vi hipnotizada, incapaz de correr, enquanto a coisa falava comigo, dentro da minha cabeça, expelindo palavras que eu não compreendia, exibindo imagens grotescas de lugares povoados de cadáveres caminhantes. Só consegui guardar o final da frase, que a criatura repetia em minha mente. Me desprendi do transe, mais assustada com aquilo do que com qualquer coisa que já tenha visto na vida, aterrorizada, gritei, corri, gritei mais, arremessando as coisas pelo caminho.

As palavras ressoavam em minha cabeça e até hoje sinto um horror tomar conta de mim ao lembrá-las.

* CONTINUA NA PRÓXIMA SEMANA

LUCIANO SILVA é escritor em Londrina


Só tenho dizer que após seis anos atravessando o bosque a noite eu me reconheci no relato dessa menina blogueira, Luciano. Aguardo ansiosamente o desfecho desta história torcendo para um final feliz! Mas, tensa...

JORNADA AO ALÉM

- Sou mãe-de-santo!

Não me lembro em que momento a conversa se enveredou para esse lado. Um breve silêncio calou o diálogo que havia começado com um simples "a doutora já te atende". Aquela era a segunda consulta com a psicóloga e no meu imediatismo já imaginei que todo o tratamento, aliado ao forte e caro antidepressivo, não surtiria o efeito desejado. A metade da primeira caixa de remédio ainda trazia no peito a angústia daquele dia - na verdade na semana passada - em que procurei o neurologista.

Havia lido em algum site esotérico os sintomas: indisposição? Falta de concentração? Intranquilidade?  Dores generalizadas pelo corpo? Nada parece dar certo na sua vida? Sim, respondia sempre empolgada a cada pergunta que era feita. O diagnóstico foi preciso: alguma alma que vaga perdida pelo mundo anda atormentando sua vida. Eu sabia! Era encosto.

Dessa forma, a informação tão prestativamente fornecida pela secretária seria útil em algum momento da minha vida. Certamente precisaria mais do auxílio dela do que da ajuda da doutora, formada com honras, depois de cinco exaustivos anos, exclusivamente dedicados aos estudos. O meu silêncio demorou o tempo de recuperar o raciocínio, enquanto a secretária engolia um gole de chá e pegava no seu arquivo a minha ficha médica.

- Crise no casamento, crise no trabalho, crises de choro, alterações bruscas de humor. Estresse. Depressão. Hum... Enquanto lia as informações que até aquele momento somente eu e a doutora tínhamos, ela fechava os olhos, respirava fundo, coçava a cabeleira loira com raízes pretas e me encarava ameaçadoramente.

- O seu caso é típico. Você está com encosto!

Bingo! Eu estava certa. Diante do diagnóstico preciso da minha mais nova confidente não hesitei em pegar o folheto que ela oferecia.

- É fácil chegar. Quando estiver no bar do Tonhão, é só pegar a quinta rua à esquerda. Segue até encontrar uma bifurcação, mas você não entra nem pela direita nem pela esquerda, pega uma estradinha um pouquinho antes. Anda uns dois, três, cinco, talvez dez quilômetros e pergunte pelo terreiro da mãe preta. Sou eu. Não tem erro.

No dia seguinte, segui em direção ao bar do Tonhão. Rodei até descobrir que o bar do Tonhão era na verdade o bar do Tição. Corrigida a informação, segui conforme o mapa gravado na minha mente.

- Primeira, segunda, terceira, quarta, quinta. É aqui que viro.

A rua indicada estava interditada.

- A senhora tem que subir umas duas quadras e pegar a rua de cima. Depois anda duas quadras e vira à esquerda e depois desce outras duas quadras para voltar à rua.
Essa foi a informação prestada por um moleque que jogava bola na esquina.
- Não tem erro, certificou.

Depois de uns bons quilômetros rodando em ruas esburacadas que não levavam a lugar algum, descobriria que tinha sérios problemas com essa frase: "Não tem erro". Era bem provável que, àquela altura, o tal do meu encosto estivesse agindo, ou desistido definitivamente de mim dando lugar à falta de sorte. Aliás, acreditava que naquele momento ele ria da minha cara! Além de não encontrar o terreiro recomendado, acabei ficando na estrada com dois pneus furados, e mais um calo no pé, causado pela saga atrás de um telefone público. Por que celular só se fosse para calcular a gasolina gasta por quilometro rodado. Se nem Oxum, ou seja lá o que for, me dava algum sinal, imagina o celular. A busca milagrosa de cura causou também mais alguns reais a menos no bolso pelo pagamento do guincho.

Desisti deste método de tratamento e resolvi seguir o original. Ignorei também as receitas dadas por todo mundo. É incrível como as pessoas têm um método muito bom para qualquer coisa. Seja um suco da tal semente de uma tal planta, uma corrente de oração pedindo alguma intervenção divina ou um chá da lasca da madeira de uma árvore que provavelmente só exista na floresta amazônica.

Enfim! Duas semanas depois da trágica busca, voltei para a minha fiel psicóloga, o que, aliás, nunca deveria ter deixado. Óculos escuro e um providencial boné me garantiam o anonimato.

Sentei no sofá fazendo o mínimo barulho para não ser notada pela secretária ou mãe preta, seja lá o que era aquela figura quase à minha frente. Para ajudar no disfarce, peguei a primeira revista que estava ao meu alcance, dessas que contam em detalhes de como terminou o romance de fulana com beltrano e taquei-a em frente ao rosto, concentradíssima na leitura. Só levantei os olhos quando ouvi a empolgada conversa de um paciente com a prestativa secretária:

- Sou mãe-de-santo!

ÉRICA BUSNARDO é jornalista em Ponta Grossa


E, nossa protagonista Érica? A meio caminho de um terreiro, com dois pneus furados, sem gasolina e sem sinal de celular, um mau humor lascado e calos nos pés. Quando ela achou o telefone publico, ela conseguiu comprar um cartão com unidades? Pra quem ela ligou? Sempre tenho tantas perguntas...



E, se você quer escrever uma história bonita para dar fim a essa sessão de contos da meia-noite no Histórias Mínimas, será muito bem recebido! [email protected] - Aguardo ansiosamente...